Em Brasília, na Embaixada da Palestina, o ministro da Agricultura e Pecuária, Carlos Fávaro, participou de um encontro de alto nível com o Conselho de Embaixadores da Liga dos Estados Árabes. A reunião reuniu representantes do governo brasileiro, diplomatas de países árabes, executivos da Câmara de Comércio Árabe-Brasileira (CCAB), empresários do agronegócio e adidos agrícolas. Na pauta, a expansão de parcerias comerciais, a diversificação da pauta de importações e exportações e a coordenação de ações para dar mais previsibilidade às trocas entre o Brasil e os mercados árabes.
Ao longo do encontro, Fávaro ressaltou que as relações diplomáticas entre o Brasil e a Liga dos Estados Árabes completam 80 anos e frisou o protagonismo brasileiro no fornecimento de alimentos, com destaque para a proteína certificada halal. Segundo o ministro, cerca de três quartos do que o Brasil vende à região é originado da agropecuária. A CCAB lembrou que o comércio bilateral gira na casa de US$ 33 bilhões por ano, enquanto o Itamaraty apontou aumento expressivo das trocas na comparação com 2023. A conversa também abordou fertilizantes, certificações, habilitação de plantas, novas aberturas de mercado e o programa Caminho Verde Brasil, apresentado ao corpo diplomático árabe.
Encontro reúne governo, embaixadores e setor produtivo
O encontro ocorreu na Embaixada da Palestina, em Brasília, e foi descrito pelos participantes como uma agenda de trabalho voltada à integração de prioridades. Além do ministro Carlos Fávaro e do embaixador palestino Ibrahim Alzeben, participaram embaixadores de países como Marrocos, Bahrein, Arábia Saudita, Síria, Catar, Líbia, Kuwait, Argélia e Mauritânia, representantes da própria Liga dos Estados Árabes, encarregados de Negócios do Iraque e da Tunísia e delegações das embaixadas da Jordânia e de Omã. Do lado brasileiro, estiveram presentes dirigentes do Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa), lideranças da CCAB, adidos agrícolas e representantes de entidades do setor.
A dinâmica da reunião privilegiou exposições curtas e objetivas, seguidas de rodadas de perguntas técnicas. Segundo participantes, o foco esteve em gargalos que podem ser resolvidos no curto prazo — como procedimentos sanitários e fitossanitários, prazos de certificação e mecanismos de verificação — e em projetos de médio prazo, a exemplo de missões empresariais e aproximação entre agências reguladoras. O formato buscou alinhar expectativas e organizar uma agenda comum para os próximos meses, com pontos de acompanhamento definidos.
O que disse Carlos Fávaro
Em sua fala, o ministro Carlos Fávaro ressaltou que o Brasil se consolidou como um provedor regular de alimentos para os países árabes. Ao destacar o papel do país na oferta de proteína halal, ele observou que aproximadamente 75% dos embarques brasileiros destinados à Liga dos Estados Árabes são originados da agropecuária, com ênfase em carnes de aves e bovinos, açúcar, milho e mel. Fávaro pontuou que a relação construída ao longo de oito décadas se baseia em previsibilidade, qualidade e cumprimento de requisitos sanitários e de rotulagem.
O ministro afirmou que o governo busca ampliar a cooperação de forma bilateral, não apenas como vendedor, mas também como comprador. Ele citou fertilizantes como uma prioridade pela relevância direta na produção agrícola brasileira e mencionou o interesse em diversificar aquisições de outros itens ofertados pelos países árabes. A avaliação do ministério é que a interdependência gera mais estabilidade de preços, melhora a coordenação logística e contribui para contratos de prazo mais longo com cláusulas de desempenho e garantia de fornecimento.
Números do comércio e metas de expansão
Dados apresentados pela CCAB apontam fluxo anual próximo de US$ 33 bilhões entre o Brasil e os países árabes. Em linhas gerais, o Brasil exporta proteínas, açúcar, milho, café, suco de laranja e outros itens do agro, enquanto importa principalmente combustíveis, fertilizantes e produtos químicos, além de bens industriais específicos. A dispersão de produtos por país é heterogênea: alguns mercados têm preferência consolidada por cortes específicos de carne, enquanto outros priorizam grãos, derivados e alimentos processados com certificação halal.
O Itamaraty relatou crescimento expressivo nas trocas na comparação com 2023, atribuído à combinação de maior habilitação de plantas frigoríficas, retomada de operações logísticas e contratos firmados com validade plurianual. Embora as condições de preços internacionais sejam voláteis, a leitura dos técnicos é que, com previsibilidade sanitária e estabilidade de fornecimento, há espaço para ampliar volumes e agregar valor. O objetivo não é apenas vender mais, mas ampliar a presença em nichos diferenciados, como cortes premium, alimentos processados e bebidas com certificação específica para o consumo nos países da região.
Halal: como funciona a certificação e por que o Brasil é relevante
A certificação halal envolve um conjunto de regras de abate, processamento e logística que assegura conformidade a padrões religiosos e culturais exigidos por mercados árabes e islâmicos. O processo vai além do frigorífico: começa com a rastreabilidade dos animais, passa por auditorias em linha de abate, controle de insumos, segregação de fluxo nas plantas de processamento e segue até a armazenagem e o transporte, com lacres e documentação específicos. Auditores independentes e entidades reconhecidas acompanham cada etapa e emitem certificados aceitos pelas autoridades dos países importadores.
O Brasil ganhou escala em proteína halal por combinar disponibilidade de matéria-prima, plantas com alto nível de automação e equipes treinadas segundo os protocolos exigidos. A experiência acumulada em auditorias presenciais, a padronização de procedimentos e a integração com as autoridades veterinárias federais facilitaram a expansão. Para os mercados árabes, a consistência de fornecimento e a aderência a requisitos detalhados, como rotulagem em árabe e controle de temperatura ao longo da cadeia fria, pesam tanto quanto o preço final. É por isso que frigoríficos brasileiros mantêm processos específicos e times dedicados para essas operações.
Produtos em pauta: carnes, açúcar, milho, mel, café e suco de laranja
A proteína animal lidera as exportações, com frango e carne bovina à frente. No frango, o Brasil se notabilizou pela oferta padronizada de cortes e pela capacidade de atender a contratos de grande porte, com entregas regulares e acompanhamento de indicadores como rendimento de carcaça e padronização de peso. Na carne bovina, há demanda de países árabes por cortes específicos, tanto para o consumo cotidiano quanto para datas comemorativas, o que exige planejamento fino de desossa e embalagem. Frigoríficos também ajustam linhas para porcionamento e porções a vácuo, segmento com margem superior ao produto in natura.
Na pauta de grãos e derivados, açúcar e milho respondem por volumes expressivos. O açúcar brasileiro tem competitividade por escala de produção e eficiência industrial, além de forte presença em contratos de longo prazo. O milho, por sua vez, atende tanto à demanda de consumo humano quanto à formulação de rações, com importância estratégica para cadeias de proteína animal na região. Café e suco de laranja ampliam a lista, com espaço para produtos de valor agregado, como cafés especiais e sucos concentrados para a indústria de bebidas. O mel, embora com menor volume, é nicho em expansão graças a fornecedores que cumprem especificações rígidas de pureza e rotulagem.
Parcerias para fertilizantes e oferta de insumos dos países árabes
A fala do ministro também abordou a necessidade de reforçar acordos de fornecimento de fertilizantes. Países árabes possuem capacidade relevante na produção de nitrogenados, fosfatados e potássicos, além de intermediários usados na indústria química. Ao intensificar a cooperação, a expectativa é obter maior previsibilidade na entrega, cláusulas de flexibilidade para ajuste de volumes e desenvolvimento conjunto de soluções adaptadas ao calendário agrícola brasileiro. Fornecimento estável de insumos impacta diretamente a produtividade, a margem do produtor e o planejamento de safras sucessivas.
Do ponto de vista operacional, contratos de fertilizantes exigem coordenação entre tradings, terminais portuários, armazéns e transportadoras. A aproximação diplomática pode facilitar janelas de navios, priorizar rotas e reduzir tempo de espera. Além da compra direta, há espaço para parcerias industriais, com intercâmbio de tecnologia e, em alguns casos, participação em projetos de expansão de capacidade nos países fornecedores. Para o Brasil, diversificar origens é uma forma de diluir riscos e reduzir a exposição a choques de oferta globais.
Papel da Embrapa e cooperação técnica com a região árabe
A presidente da Embrapa, Silvia Massruhá, reforçou a relevância da pesquisa aplicada ao campo. A instituição é reconhecida por desenvolver cultivares, protocolos de manejo e soluções de sanidade que elevam a eficiência da produção. Em agendas com países árabes, a cooperação costuma incluir intercâmbio de pesquisadores, treinamento de equipes técnicas e projetos-piloto que conectam necessidades de compradores a soluções de produtores brasileiros. Essa ponte é útil, por exemplo, para alinhar padrões de qualidade, consistência de lotes e formatos de apresentação do produto final.
O diálogo técnico ainda abarca rastreabilidade, gestão de risco sanitário e métodos de amostragem. Em cadeias de proteína halal, os protocolos são detalhados e exigem documentação precisa, o que demanda sistemas de informação integrados. É nesse ponto que acordos institucionais reduzem atritos, ao permitir validação antecipada de procedimentos e reconhecimento de auditorias. Para os exportadores, isso se traduz em menos incerteza e em ciclos de negociação mais curtos. Para os importadores, garante que entregas cheguem dentro das especificações esperadas, com menor chance de não conformidade.
Caminho Verde Brasil: metas, etapas e impactos na oferta interna
Ao final da exposição, o ministro apresentou o programa Caminho Verde Brasil. A proposta tem como meta recuperar até 40 milhões de hectares de pastagens de baixa produtividade ao longo dos próximos dez anos, convertendo parte dessas áreas em produção agrícola de alto rendimento. A lógica é elevar a eficiência do uso de áreas já abertas por meio de manejo adequado, melhor genética e tecnologia de precisão. Com isso, a oferta de grãos e fibras pode crescer com base em ganhos de produtividade e reorganização do uso do solo nas propriedades.
Na prática, o programa prevê etapas como diagnóstico da situação das pastagens, correção de solo conforme recomendação agronômica, adubação equilibrada, escolha de cultivares compatíveis e rotação adequada. Para quem optar por integrar lavoura e pecuária, a agenda técnica inclui planejamento de lotação, calendário de semeadura, definição de janelas de colheita e protocolos de manejo para manter a produtividade do rebanho. O objetivo declarado é elevar a produção com previsibilidade, ajudando a compor estoques e a atender contratos de exportação sem interrupções.
Diplomacia econômica: por que encontros desse tipo fazem diferença
Reuniões de alto nível entre governo, embaixadores e setor privado tendem a acelerar destraves regulatórios e a pavimentar novas frentes de negócios. Parte das demandas comerciais depende de decisões técnicas, como equivalência de sistemas de inspeção, reconhecimento de laboratórios e atualizações de listas de estabelecimentos habilitados. Quando as equipes políticas e técnicas sentam juntas, fica mais claro qual é o caminho para cumprir etapas e qual cronograma é viável. A previsibilidade que decorre disso oferece base para contratos maiores e investimentos em plantas e logística.
Além disso, agendas conjuntas ajudam a calibrar expectativas de qualidade e de volume. Dependendo do produto, o importador prefere uma combinação específica de embalagem, vida de prateleira e padrão de corte. Quanto antes essas preferências são comunicadas e testadas, menor o risco de devoluções e de reprocessamento. Outro ponto é a inteligência de mercado compartilhada: com visão mais nítida de demanda e sazonalidade, exportadores podem programar abates e colheitas em períodos que maximizem o aproveitamento industrial e minimizem custos logísticos.
Atores da reunião: quem esteve à mesa e qual o papel de cada um
Na diplomacia, a composição da mesa indica prioridades. O encontro contou com embaixadores do Marrocos, Bahrein, Arábia Saudita, Síria, Catar, Líbia, Kuwait, Argélia e Mauritânia, além de representantes da Liga dos Estados Árabes e das embaixadas da Jordânia e de Omã. Houve ainda a presença dos encarregados de Negócios do Iraque e da Tunísia. Pelo lado brasileiro, participaram o secretário-executivo adjunto do Mapa, Cleber Soares, o secretário-adjunto de Comércio e Relações Internacionais, Marcel Moreira, e a chefe de Assessoria Especial de Comunicação Social, Carla Madeira, entre outras autoridades. O presidente da CCAB, William Adib Dib, também esteve presente, reforçando a interface com o setor privado.
Cada ator cumpre uma função específica nessa engrenagem. Embaixadas tratam de protocolos, vistos para equipes técnicas e agendas oficiais. O Mapa coordena a parte regulatória, a interlocução com o setor produtivo e a articulação com o Itamaraty. A CCAB serve de ponte com empresas, organiza missões e mapeia oportunidades. Adidos agrícolas, por sua vez, operam na linha de frente, acompanhando exigências locais, atualizações de normas e procedimentos de habilitação. Esse arranjo dá velocidade às decisões, sobretudo quando há prazos de embarque e contratos com cláusulas rígidas de entrega.
Sanidade, certificações e habilitação de plantas: o passo a passo para vender mais
Para aumentar embarques, a primeira exigência é cumprir requisitos sanitários e fitossanitários dos países importadores. No caso de proteína halal, somam-se as normas específicas de abate e processamento. O fluxo típico começa com a solicitação de habilitação da planta, passa por auditorias documentais e inspeção in loco, e segue para a emissão de certificados por partida. Em muitos mercados, as missões de auditoria são periódicas e devem ser revalidadas quando há mudanças de processo, ampliação de capacidade ou alteração de lay-out na unidade produtiva. Por isso, empresas mantêm equipes dedicadas a atualizar dossiês e acompanhar calendários de auditoria.
Outro ponto é a rastreabilidade. Lotes precisam estar identificados e vinculados a registros confiáveis em cada etapa, do abate ao embarque. Isso vale para carnes, grãos, lácteos, alimentos processados e bebidas. A clareza documental evita atrasos em portos, reduz risco de não conformidade e ajuda a solucionar dúvidas rapidamente junto às autoridades dos países árabes. Para o exportador, o investimento em sistemas de rastreabilidade e treinamento de equipes costuma ser compensado pela redução de contingências e pela possibilidade de acessar mercados que pagam prêmio por previsibilidade e padronização.
Logística: prazos, rotas e janelas de embarque para o Oriente Médio e Norte da África
No transporte para países árabes, a operação logística combina porto de origem, tempo de trânsito e exigências de cadeia fria. Embarques de proteína congelada saem de portos como Santos, Paranaguá, Itajaí, Rio Grande e Navegantes, entre outros. A rota típica para o Golfo envolve navegação pelo Atlântico, transbordo quando aplicável e travessia até o Canal de Suez, com prazos que variam conforme destino final e escala. Já para o Norte da África e o Levante, os tempos costumam ser menores quando há operação direta ou transbordo eficiente no Mediterrâneo. Para cargas refrigeradas, o controle de temperatura, a manutenção de contêineres e a disponibilidade de tomadas em terminais são variáveis críticas.
A janela de embarque é ajustada para casar com a programação dos navios e com o calendário comercial de cada país. No Ramadã e em feriados prolongados, cresce a demanda por determinados itens, o que exige planejamento de frigoríficos, armazéns e armadores para evitar gargalos. Empresas que mantêm estoque avançado em hubs estratégicos conseguem responder com mais agilidade a picos de consumo, mas esse modelo depende de custos de armazenagem e de capital. A coordenação entre exportador, agente de carga e importador reduz atrasos e melhora a utilização dos contêineres, fator que pesa na rentabilidade das operações.
Preços, tarifas e concorrência: leitura do mercado e alternativas de venda
Em sua intervenção, o ministro citou tarifas impostas por outros mercados a produtos brasileiros e defendeu o fortalecimento de parcerias com os países árabes como alternativa para diversificar destinos e reduzir exposição a medidas unilaterais. Em linhas gerais, exportadores buscam contratos de médio e longo prazos para suavizar variações de preço e, quando possível, incluir fórmulas de reajuste indexadas a indicadores internacionais. Em segmentos de proteína e açúcar, por exemplo, a concorrência é global e inclui fornecedores que competem com logística favorável ou acordos preferenciais. A construção de relações estáveis tende a mitigar oscilações de curto prazo e a criar espaço para produtos de maior valor agregado.
A competição também se dá em requisitos técnicos. Empresas que demonstram pontualidade, baixa taxa de não conformidade e atendimento a especificações detalhadas costumam ter preferência na renovação de contratos. Quando surgem barreiras temporárias — por exemplo, mudanças em exigências de rotulagem ou atualização de certificados —, a rapidez na adaptação determina quem mantém prateleira. Por isso, a interlocução constante com autoridades e câmaras de comércio é parte do trabalho, e encontros como o de Brasília funcionam como aceleradores para alinhar expectativas e estabelecer cronogramas de adequação.
Exemplos recentes de negócios viabilizados e nichos em ascensão
No balanço apresentado, o Mapa citou avanços em frentes como a venda de ovos férteis para a Arábia Saudita, a abertura para açaí no Egito e oportunidades em café e suco de laranja nos Emirados Árabes Unidos. Esses movimentos indicam que há demanda além das proteínas tradicionais. Ovos férteis exigem logística precisa e controle sanitário reforçado; o açaí, por sua vez, pede processamento que preserve características sensoriais e padronização de laudos. Em bebidas, a especificidade do mercado vai do café em grão a cápsulas, passando por blends e linhas premium, enquanto o suco demanda acordos com fabricantes locais e redes de varejo.
Outro nicho citado pelos participantes é a economia halal em sentido amplo, que abrange alimentos industrializados, cosméticos, medicamentos e serviços com certificações específicas. O interesse de compradores por rastreabilidade e conformidade abre espaço para empresas brasileiras que possam adaptar linhas, capacitar equipes e comprovar controle de processos. A vantagem competitiva não está apenas no preço, mas na capacidade de entregar exatamente o que o mercado final solicita, com documentação consistente e atendimento ágil a auditorias e amostragens.
Como exportadores podem se preparar: passos práticos e rotinas essenciais
Para quem mira os países árabes, a preparação começa pela leitura das normas do país de destino e pela escolha de uma certificadora reconhecida. Em seguida, é importante ajustar procedimentos internos: segregação de linhas, registros com identificação de lotes, controle de temperatura e manutenção preventiva de equipamentos. Empresas que exportam carne precisam treinar equipes no protocolo halal, incluindo detalhes de abate, higienização e embalagem. A gestão documental — com certificados, laudos e relatórios — deve ser digital e auditável para facilitar inspeções.
No campo comercial, mapear distribuidores locais, entender o posicionamento por faixa de preço e avaliar canais de venda são etapas que reduzem riscos. Em alimentos processados, a adaptação de rótulos e a tradução correta de informações são cruciais para evitar retenções em portos. Em operações de maior escala, é comum negociar cláusulas de desempenho logístico e mecanismos de resolução de controvérsias. A participação em feiras setoriais da região e o agendamento de reuniões com redes varejistas e importadores estruturados aceleram a curva de aprendizado e encurtam o ciclo de negociação.
Integração lavoura-pecuária e ganho de eficiência em áreas já abertas
A estratégia de recuperar pastagens de baixa produtividade dialoga com modelos de integração lavoura-pecuária. Propriedades que adotam plantio de grãos em rotação com forrageiras conseguem distribuir melhor o uso de máquinas, reduzir períodos de ociosidade e manter o solo coberto com culturas de serviço. Esse arranjo costuma elevar o ganho por hectare e tornar mais previsível a oferta de animais terminados, o que favorece frigoríficos que trabalham com janelas rígidas de abate. Ao mesmo tempo, melhora a regularidade de entrega de grãos para moinhos e fábricas de ração.
O planejamento técnico leva em conta análise de solo, calendário de semeadura, escolha de cultivares e índices zootécnicos. A combinação adequada de insumos, associados ao uso racional de maquinário e a monitoramento por imagens de satélite, ajuda a reduzir desvios entre produtividade esperada e realizada. Para exportadores, cadeias mais previsíveis resultam em melhor cumprimento de janelas de embarque. Para compradores, a vantagem está na segurança de fornecimento, atributo decisivo em mercados que trabalham com campanhas promocionais e datas específicas no varejo.
Agilidade regulatória e previsibilidade contratual: como destravar projetos
Do lado regulatório, a clareza de requisitos reduz custos de transação. Checklists compartilhados com antecedência, comunicação sobre mudanças normativas e construção de cronogramas factíveis para auditorias diminuem o risco de interrupções. No plano contratual, prazos de pagamento, garantias bancárias e seguros de crédito à exportação são componentes que tornam operações mais robustas. Em setores perecíveis, cláusulas sobre manutenção de cadeia fria e prazos de devolução em caso de avarias precisam ser detalhadas para evitar litígios.
Encontros de alto nível servem para que esses instrumentos sejam alinhados entre autoridades e empresas. Quando há consenso sobre métricas de desempenho — por exemplo, taxa máxima de não conformidade por lote ou prazo de resposta a apontamentos de auditoria —, a negociação de preços e volumes ganha objetividade. Esse equilíbrio contribui para que os contratos sejam renovados com menos atritos e abram espaço a novos itens na pauta comercial, de alimentos processados a insumos estratégicos para a produção agropecuária.
Importância da padronização de rótulos, idiomas e informações ao consumidor
Rotulagem é um ponto sensível em operações com múltiplos destinos. Mercados árabes exigem informações claras em árabe, e, em muitos casos, também em inglês. Além de itens obrigatórios como composição, validade e lote, há orientações específicas para produtos com certificação halal. Empresas que padronizam modelos de rótulo e estabelecem processos de revisão linguística reduzem erros de digitação e divergências de tradução. Isso evita retenções, multas e relabeling, operações que afetam custo e tempo de prateleira.
A padronização se estende às embalagens. Para proteína animal, a resistência do material, o tipo de vedação e a forma de empilhamento em contêineres impactam perdas e devoluções. Em alimentos processados, a escolha entre frasco, lata ou cartucho influencia logística e percepção do consumidor. Quanto mais cedo o fornecedor conhece a preferência do importador, mais rápido adapta sua linha e minimiza retrabalho. Os ganhos aparecem no tempo de aprovação, na redução de não conformidades e na recorrência de pedidos.
Apoio institucional e papel das câmaras de comércio
Câmaras de comércio e embaixadas funcionam como centrais de matchmaking entre compradores e vendedores. Elas oferecem informações sobre exigências locais, agendas de feiras, rodadas de negócios e perfis de importadores. No caso da CCAB, o trabalho inclui também a tradução de necessidades do varejo árabe para o produtor brasileiro e a identificação de oportunidades em categorias menos exploradas. Esse suporte complementa as ações das embaixadas, que tratam de questões protocolares, e dos adidos agrícolas, que monitoram normas técnicas no dia a dia.
Para empresas, acessar essa rede encurta caminhos. Em vez de começar do zero, o exportador entra em contato com uma lista de potenciais parceiros já filtrada por histórico, porte e perfil de risco. Nos últimos anos, o uso de plataformas digitais e de reuniões virtuais ampliou o alcance dessas conexões, permitindo validar oportunidades antes de investir em viagens e amostras. Quando a negociação evolui, as entidades ajudam a ajustar cronogramas de auditoria e a organizar visitas técnicas às plantas industriais.
Calendário comercial e sazonalidade da demanda nos países árabes
A demanda na região árabe tem picos previsíveis ao longo do ano, associados a datas religiosas e feriados nacionais. Em determinados períodos, cresce a procura por cortes específicos de proteína e por alimentos processados em embalagens familiares. Para atender a esses movimentos, exportadores precisam ajustar produção, estoque e logística com antecedência. O planejamento inclui calibrar o mix de produtos, reservar contêineres refrigerados e alinhar com distribuidores locais as janelas de chegada em portos e centros de distribuição.
A previsibilidade também ajuda a negociar preços. Quando as duas pontas conhecem os picos de consumo, é possível organizar campanhas no varejo, definir volumes mínimos por mês e estabelecer um calendário de reposição. Esse arranjo dá mais estabilidade às margens e reduz perdas. Para produtos sensíveis a temperatura, como carnes e lácteos, a programação de entrega deve considerar capacidade de armazenagem e de expedição no destino para evitar gargalos que impactem a validade e a qualidade percebida pelo consumidor.
Financiamento, seguros e garantias nas operações com a região árabe
Operações internacionais exigem engenharia financeira. Linhas de crédito à exportação, seguros de crédito e garantias bancárias são ferramentas para reduzir risco e viabilizar prazos de pagamento compatíveis com o ciclo da mercadoria. Em contratos com redes varejistas de grande porte, é comum o uso de cartas de crédito com condições bem definidas de apresentação de documentos e liberação de recursos. Para o exportador, a disciplina na gestão de documentos — conhecimento de embarque, faturas, certificados — é vital para evitar discrepâncias que atrasem o pagamento.
Seguros de transporte, inclusive para cadeia fria, cobrem avarias e perdas. Em rotas longas, a escolha do armador, a política de transbordo e a qualidade de contêineres refrigerados têm impacto no risco. Já em negócios com prazos mais extensos, mecanismos de hedge cambial ajudam a proteger margens diante de oscilações de moeda. A combinação dessas práticas com boa interlocução diplomática e clareza regulatória tende a reduzir incertezas e a aumentar a competitividade do produto brasileiro na gôndola.
O que esperar a partir de agora: agenda e próximos passos possíveis
Após a reunião em Brasília, a tendência é que grupos técnicos avancem em frentes específicas: listas de plantas a habilitar, calendários de auditorias, ajustes de rotulagem e etapas para a ampliação do escopo halal em alimentos processados. No campo logístico, deve haver conversas sobre janelas de navios e previsões de volumes por trimestre, especialmente para proteína animal e açúcar. Em paralelo, a CCAB e o Mapa devem organizar rodadas de negócios e visitas de compradores a plantas brasileiras como forma de acelerar validações técnicas e comerciais.
No eixo de insumos, a expectativa é retomar tratativas sobre fertilizantes e produtos correlatos, com foco em contratos que deem estabilidade de fornecimento. Em termos de produtos, há espaço para aprofundar a presença de café, suco de laranja e açaí, além de consolidar nichos como o mel. Na proteína, o objetivo é manter a regularidade de entregas e garantir atendimento a especificações cada vez mais detalhadas. Ao final, a combinação de previsibilidade, diálogo regulatório e capacidade industrial deve orientar a relação comercial entre Brasil e países árabes nos próximos ciclos.