O desembolso rural do primeiro bimestre do Plano Safra 2025/2026 avança em linha com o observado no ciclo passado, apesar da desaceleração de julho. Excluindo o Pronaf, as concessões somaram R$ 81,11 bilhões entre julho e agosto de 2025. Quando se incluem também os contratos já firmados, mas ainda em fase de liberação, o volume pode alcançar R$ 99,08 bilhões, praticamente colado nos R$ 100,81 bilhões registrados no mesmo período de 2024/2025. A diferença é de 1,75% a menos, o que indica certa estabilidade no ritmo de crédito nesta virada de safra.
Em julho, o crédito rural, sem considerar o Pronaf, caiu 8% na comparação anual: foram R$ 39,5 bilhões concedidos, ante R$ 42,8 bilhões no mesmo mês do ciclo anterior. O quadro muda ao se observar o que já está contratado e ainda aguarda liberação. Com esse acréscimo, julho alcança R$ 49,58 bilhões, o que representa avanço de 15,76% frente ao observado um ano antes. Como o registro oficial só ocorre quando o dinheiro é efetivamente liberado ao produtor, e esse processo pode levar até 360 dias, o acompanhamento do bimestre inicial pede atenção a dois movimentos: o que já saiu da conta do banco e o que está na fila para sair.
Desempenho no 1º bimestre: o que mostram os números
Entre 1º de julho e 31 de agosto de 2025, as concessões de crédito rural atingiram R$ 81,11 bilhões, sem Pronaf. O custeio respondeu por R$ 33,72 bilhões, refletindo a preparação de lavouras e a compra de insumos. Em investimento, houve R$ 4,48 bilhões, ritmo que tende a ganhar força conforme a rede bancária ajusta limites, linhas e prazos. A comercialização chegou a R$ 4,36 bilhões, enquanto a industrialização somou R$ 5,36 bilhões. O destaque do período ficou com as emissões de Cédula de Produto Rural (CPR), que registraram R$ 33,19 bilhões, sinalizando a importância do instrumento na gestão de caixa e no financiamento da safra.
Quando se adiciona o montante já contratado e ainda não liberado, o total do bimestre pode ir a R$ 99,08 bilhões. Em igual janela de 2024, o volume havia sido de R$ 100,81 bilhões. A diferença de 1,75% indica que o ciclo 2025/2026 começou com fôlego semelhante ao anterior. A leitura sugere que a queda de julho foi mais pontual do que estrutural, vinculada ao calendário das liberações e ao processo de retroalimentação dos bancos, que reabastecem limites à medida que recebimentos e captações vão se consolidando.
Contratado x concedido: como ler os dados e por que isso importa
Os relatórios oficiais de crédito rural registram os valores no momento da concessão, isto é, quando o recurso sai do banco para a conta do produtor ou é liquidado diretamente contra fornecedores. O contrato assinado antes disso não entra de imediato nas estatísticas de desembolso. É por isso que, em julho de 2025, o consolidado “puro” apontou R$ 39,5 bilhões, mas o número sobe para R$ 49,58 bilhões quando se adiciona o que já estava contratado e passou a compor a fila de liberações. Esse descompasso entre assinatura e liberação é parte inerente do sistema e pode chegar a 360 dias, a depender da modalidade e da operação.
Para quem acompanha o Plano Safra, isso significa que os dados de curto prazo não contam toda a história. O pipeline de contratos é relevante para dimensionar a demanda real, a pressão sobre as fontes e a provável trajetória do desembolso nos meses seguintes. Em momentos de forte contratação, os bancos organizam a agenda de liberações e priorizam custeio em janelas críticas do calendário agrícola, enquanto investimentos e operações industriais, por vezes, seguem fluxo próprio, alinhado à entrega de máquinas, obras e projetos. A leitura conjunta de concedido e contratado ajuda a distinguir um “vale” temporário de uma mudança efetiva no apetite de crédito.
Fontes controladas: composição, regras e participação no Plano
Do total de R$ 516 bilhões anunciados para o Plano Safra 2025/2026, R$ 174,6 bilhões são recursos controlados, o equivalente a 34% do montante. Nessa categoria, as taxas de juros são fixas e pré-definidas pelas políticas públicas e pelas normas do sistema financeiro. Entram aí os Recursos Obrigatórios de depósitos à vista (MCR 6-2), os Fundos Constitucionais de Financiamento (FCO, FNO e FNE), o Funcafé e os recursos equalizados. Esses blocos seguem regras específicas de aplicação e fiscalização, com prazos, limites e finalidades detalhados em normativos e manuais operacionais.
A presença das fontes controladas fornece previsibilidade de juro e estabilidade de oferta nas linhas mais tradicionais de custeio e investimento. Por serem instrumentos regulados, bancos e cooperativas operam com metas claras de alocação e de cumprimento de exigibilidades. Na prática, isso reduz a oscilação de condições de uma safra para outra e ajuda a preservar a competitividade do crédito rural diante de choques de captação ou de mudanças nas condições de mercado. Em paralelo, o desenho das linhas controladas costuma priorizar a base produtiva, com regras para limite por cliente, garantias e finalidades de uso do recurso.
Equalização de taxas: quem pode, quanto há e como funciona
A equalização é o mecanismo pelo qual o Tesouro Nacional paga a diferença entre o custo de captação do agente financeiro e a taxa final cobrada do mutuário. Para 2025/2026, a programação de recursos equalizados para médios e grandes produtores é de R$ 113,8 bilhões, sendo R$ 64,25 bilhões destinados ao custeio e R$ 49,53 bilhões ao investimento. O orçamento previsto para viabilizar essa diferença é de R$ 3,9 bilhões em subvenção. Assim, mesmo com custos de funding mais altos em determinados momentos do mercado, o tomador tem acesso a taxas definidas em regulamento, e o agente financeiro recebe o complemento para cobrir sua estrutura de custos e risco.
Na prática, a equalização viabiliza operações de maior prazo, especialmente em investimento, que incluem aquisição de máquinas, construção e modernização de instalações e projetos de melhoria de produtividade. A lógica é simples: sem o complemento, o banco teria de repassar integralmente o custo de captação e o prêmio de risco ao cliente, encarecendo ou até inviabilizando operações de longo prazo. Com o mecanismo, a taxa final fica compatível com a capacidade de pagamento do produtor e com o ciclo de geração de caixa da atividade. O uso desse espaço, contudo, depende de programação bancária e de disponibilidade ao longo do exercício, o que exige planejamento antecipado dos proponentes.
Recursos livres: direcionados, sem direcionamento e custos
Além das fontes controladas, o Plano Safra conta com recursos livres, que se dividem em direcionados e sem direcionamento. Os direcionados são valores que, por norma, precisam ser aplicados no crédito rural, mas com taxas livres. É o caso da poupança rural, que destina 70% da captação, e das LCAs, com 60% das emissões voltadas ao setor. Esses recursos podem ser aplicados em custeio, investimento, comercialização e industrialização, ou na aquisição de CPRs emitidas por produtores, dependendo da estratégia do banco e do perfil de demanda dos clientes.
Já os recursos livres sem direcionamento não possuem obrigação normativa de alocação no agro e, por isso, tendem a seguir o preço de mercado típico do crédito corporativo. Na composição anunciada para 2025/2026, os livres direcionados somam R$ 300 bilhões, enquanto os sem direcionamento chegam a R$ 27 bilhões. Esse último bloco corresponde a cerca de 8% do total dos livres, o que ajuda a explicar por que, na média, os encargos financeiros do crédito rural costumam ficar abaixo do praticado em linhas corporativas comuns: a obrigação de alocar parte relevante dos livres direcionados pressiona o custo para baixo e dá previsibilidade de oferta ao produtor.
CPR no Plano Safra 2025/2026: tamanho, usos e cuidados
A Cédula de Produto Rural segue como peça central de financiamento. O planejamento para 2025/2026 totaliza R$ 188,53 bilhões em operações via CPR. Desse montante, R$ 179,43 bilhões correspondem à aquisição, por instituições financeiras, de CPRs contabilizadas para cumprir as exigibilidades das LCAs. Outros R$ 9,1 bilhões são destinados ao cumprimento das exigibilidades da poupança rural. Em termos práticos, a CPR permite ao produtor monetizar parte da produção futura ou corrente, ajustando o fluxo de caixa conforme a necessidade de custeio, comercialização e rolagem de compromissos.
Como título de crédito, a CPR exige atenção aos prazos, garantias e ao lastro declarado. Em operações em que o banco compra a CPR para contabilizá-la em seu cumprimento regulatório, o preço, o indexador e a forma de liquidação são definidos no contrato. É essencial detalhar a qualidade e o volume do produto, as condições de entrega e os eventos de substituição de garantias, quando cabível. Para quem pretende operar com CPR pela primeira vez, vale organizar documentos de propriedade, regularidade fiscal, histórico de produção e eventuais contratos de venda com tradings ou indústrias, o que facilita a análise de risco e acelera a contratação.
Desempenho por finalidade: custeio, investimento, comercialização e indústria
O custeio concentrou R$ 33,72 bilhões no bimestre, em linha com a etapa de preparação de áreas e compra de insumos. A leitura é consistente com o fato de que, no início da safra, o capital de giro pesa mais que os desembolsos de longo prazo. Os financiamentos de comercialização, que somaram R$ 4,36 bilhões, refletem estratégias de retenção e venda escalonada, buscando equilibrar necessidade de caixa e a leitura de preços ao longo do período. Já a industrialização, com R$ 5,36 bilhões, sustenta operações de processamento que dependem da entrada regular de matéria-prima e do cronograma de contratos com clientes.
No investimento, os R$ 4,48 bilhões concedidos no bimestre indicam uma largada mais contida, o que não é incomum no começo do ciclo orçamentário. Programas com filas historicamente longas tendem a ganhar tração conforme as instituições confirmam os tetos de equalização, distribuem suas cotas internas e concluem a análise de projetos. Em muitos casos, a liberação acompanha a entrega do bem financiado, como máquinas e equipamentos, o que desloca parte do desembolso para meses subsequentes. O movimento observado em julho e agosto, portanto, não define o resultado do ano; ele apenas marca o passo inicial das grandes rubricas da safra.
Operação nos bancos: pulverização, BNDES e programas mais procurados
Vinte e cinco instituições financeiras operam recursos equalizáveis nesta safra. O BNDES atua com todas elas e também com aquelas que não possuem linhas próprias de equalização. Essa combinação amplia a pulverização dos financiamentos e a capilaridade no território, reduzindo a dependência de um único agente e aumentando a chance de contratação mesmo em programas com demanda intensa. Quando um banco esgota rapidamente determinada linha, outro pode ter espaço, evitando interrupções abruptas nas operações de clientes com projetos prontos para análise e desembolso.
Entre os programas de investimento que tradicionalmente concentram pedidos, destacam-se Moderfrota, Proirriga, Renovagro, Inovagro e PCA. Pausas pontuais por esgotamento de limite podem ocorrer ao longo do exercício, mas a atuação combinada de bancos e BNDES, com realocação de saldos e redistribuição de carteiras, tende a manter a continuidade. Para o produtor, a recomendação prática é manter o dossiê atualizado, com orçamentos, especificações técnicas, documentos e cadastros. Quanto mais madura estiver a proposta, maior a chance de aproveitar uma janela de disponibilidade sem perder tempo em retrabalho.
Como o produtor organiza o financiamento: passo a passo
Planejamento começa com a definição do objetivo financeiro: custeio, investimento, comercialização ou industrialização. A partir disso, o produtor escolhe a linha compatível com sua necessidade e com o calendário de caixa. Em custeio, por exemplo, é preciso mapear as datas de compra de insumos e serviços e o período estimado de colheita e venda. Em investimento, a cronologia da obra ou da entrega do equipamento determina o fluxo de liberação. Em comercialização, a estratégia de venda escalonada deve conversar com os limites de armazenagem, compromissos de entrega e capital de giro.
Com o objetivo definido, vêm os documentos: regularidade fiscal, cadastro atualizado, comprovantes de renda e patrimônio, projetos e orçamentos. Na sequência, a conversa com o gerente deve abordar três pontos essenciais: taxa e indexador, garantias e prazos. Em operações com recursos equalizados, é importante confirmar a disponibilidade do programa no banco naquele momento. Em CPR, a atenção recai sobre o lastro declarado e os eventos que podem acionar substituições de garantia. O cronograma de liberação também precisa estar claro, incluindo gatilhos vinculados à entrega de bens, à execução de obras ou a marcos contratuais de safra.
- Defina a finalidade e estime o fluxo de caixa da operação.
- Separe documentos cadastrais, fiscais e patrimoniais, além de orçamentos e projetos.
- Verifique taxas, indexadores e prazos; confirme a disponibilidade das linhas.
- Ajuste garantias e condições de liberação conforme a modalidade escolhida.
- Acompanhe a evolução do contrato até a concessão e registre o desembolso.
Regras e obrigações: exigibilidades, MCR e custo por descumprimento
Os recursos livres direcionados existem porque há exigibilidades normativas a cumprir. Poupança rural precisa direcionar 70% da captação para o crédito rural, e as LCAs destinar 60% das emissões. Essas regras estão consolidadas no Manual de Crédito Rural, que também estabelece os parâmetros de aplicação por finalidade, limites, prazos e documentação. O objetivo é garantir estabilidade de funding para as principais etapas do ciclo produtivo, reduzindo a dependência de condições pontuais do mercado financeiro e assegurando previsibilidade na ponta.
O descumprimento das exigibilidades acarreta custos para as instituições financeiras, conhecidos como Deficiência no Cumprimento das Exigibilidades (MCR 6-5). Essa penalidade funciona como incentivo econômico para que os bancos mantenham alocação adequada ao longo do exercício. Para o produtor, isso se traduz em maior probabilidade de encontrar linhas disponíveis, com encargos mais competitivos que os observados em modalidades corporativas sem vínculo regulatório. Ainda assim, é comum ver ajustes táticos de preços ao longo do ano, conforme o mercado de captação oscila e conforme cada instituição equilibra sua carteira de crédito e risco.
Boas práticas para negociar: taxa, garantias e calendário de liberação
Na negociação, três itens merecem atenção contínua. Primeiro, a taxa final, que deve ser comparada com alternativas equivalentes em prazo e risco. Em linhas com equalização, pergunte se o limite do programa está aberto naquele banco. Em recursos livres direcionados, peça o detalhamento do indexador e da composição de spread. Segundo, as garantias: avalie se o bem ofertado tem liquidez e se o custo de constituição não compromete a vantagem da taxa. Terceiro, o calendário: liberação atrelada a marcos concretos dá previsibilidade ao cronograma da safra e evita atrasos que forçam captação de emergência no curtíssimo prazo.
Outro ponto importante é a compatibilidade entre o prazo de pagamento e a geração de caixa. Em custeio, o ideal é que a primeira parcela vença após a colheita e a liquidação das vendas. Em investimento, amortizações escalonadas, com carência compatível com a instalação e início de operação do ativo, reduzem a pressão sobre o fluxo de caixa. Em CPR, revise com atenção os eventos de liquidação antecipada e as cláusulas de substituição de lastro. O produtor que simula cenários com preços, volumes e custos distintos chega à agência com mais poder de barganha e toma decisões com menor margem de improviso.
Glossário e referências regulatórias
Concessão é o momento em que o dinheiro é efetivamente liberado ao tomador, em sua conta ou diretamente a fornecedores, passando a compor o desembolso oficial. Contratação é a assinatura do contrato antes da liberação; pode ocorrer em data anterior e leva algum tempo até virar concessão. Custeio financia despesas da produção; investimento, a aquisição de bens e projetos de maior prazo; comercialização apoia a retenção e a venda escalonada; industrialização sustenta etapas de processamento dentro da cadeia.
Recursos controlados são aqueles com taxa definida por norma, como os Recursos Obrigatórios (MCR 6-2), Fundos Constitucionais, Funcafé e as linhas equalizadas. Recursos livres direcionados são captações que, por regra, precisam ser aplicadas no crédito rural, como 70% da poupança rural e 60% das LCAs. Recursos livres sem direcionamento não têm obrigação de alocação e, por isso, seguem preços mais próximos do mercado corporativo. A equalização é o pagamento, pelo Tesouro Nacional, da diferença entre o custo da fonte e a taxa final ao mutuário. Já a CPR é um título de crédito lastreado em produto agropecuário, utilizado para financiamento e gestão de caixa.
- MCR 6-2: trata dos Recursos Obrigatórios de depósitos à vista aplicados no crédito rural.
- MCR 6-5: disciplina o cumprimento das exigibilidades e a cobrança por deficiência.
- Funcafé e Fundos Constitucionais (FCO, FNO, FNE): fontes controladas com objetivos e regras específicas.
- Equalização: subvenção que alinha a taxa final ao tomador com o custo do agente financeiro.
- CPR: instrumento contratual para antecipar receita e ajustar o fluxo de caixa da safra.
Metodologia, cálculos e notas
As referências de valores desta reportagem consideram o período de 1º de julho a 31 de agosto de 2025 como primeiro bimestre do Plano Safra 2025/2026 e excluem o Pronaf. No recorte mensal de julho, o comparativo indica R$ 39,5 bilhões concedidos contra R$ 42,8 bilhões no mesmo mês do ciclo anterior, uma queda de 8%. Ao incluir contratos firmados e ainda não liberados, julho alcança R$ 49,58 bilhões, o que representa avanço de 15,76% na comparação anual. O bimestre registrou R$ 81,11 bilhões em concessões: R$ 33,72 bilhões em custeio, R$ 4,48 bilhões em investimento, R$ 4,36 bilhões em comercialização, R$ 5,36 bilhões em industrialização e R$ 33,19 bilhões em CPR. Considerando contratações ainda não desembolsadas, o total pode chegar a R$ 99,08 bilhões, ante R$ 100,81 bilhões um ano antes, variação de -1,75%.
No lado da oferta, o Plano Safra 2025/2026 soma R$ 516 bilhões, dos quais R$ 174,6 bilhões (34%) em recursos controlados. A programação de recursos equalizados para médios e grandes produtores é de R$ 113,8 bilhões, com R$ 64,25 bilhões para custeio e R$ 49,53 bilhões para investimento, suportados por R$ 3,9 bilhões em subvenção. Entre os livres, os direcionados somam R$ 300 bilhões e os sem direcionamento, R$ 27 bilhões, equivalentes a 8% do total dos livres. Em CPR, o planejamento é de R$ 188,53 bilhões, sendo R$ 179,43 bilhões vinculados a LCAs e R$ 9,1 bilhões à poupança rural. Esses números ajudam a balizar o ritmo de liberação ao longo do ciclo e explicam por que o acompanhamento de contratado e concedido, em conjunto, oferece a melhor leitura do andamento do crédito rural.