Com a alta da taxa Selic nos últimos anos, o sino da B3, tradicional símbolo da estreia das companhias na bolsa de valores, tem estado silencioso. O último IPO de uma empresa brasileira aconteceu em setembro de 2021, quando a Vittia, fabricante de insumos biológicos, fez sua oferta pública inicial.
Desde então, o mercado de capitais vive uma seca de novas ofertas. Mas, em novembro do ano passado, o som do sino voltou a ser ouvido quando a Fictor Alimentos passou a integrar o quadro de companhias listadas da B3.
Só que a forma de listagem da companhia foi um pouco diferente do comum, em que uma empresa faz uma oferta de ações.
A Fictor passou a ser negociada na bolsa após adquirir o controle da Atom Participações, que pertencia à empresária Carol Paiffer e à revista Exame, empresa comandada por sócios do banco BTG Pactual.
A Atom era voltada à educação financeira e já estava listada, o que permitiu à Fictor estrear no mercado sem fazer uma oferta inicial.
O negócio de alimentos corresponde hoje a cerca de 70% das receitas do Grupo Fictor, criado há 18 anos pelo empresário Rafael Góis. No ano passado, o grupo faturou cerca de R$ 3,5 bilhões com operações que reúnem uma comercializadora de grãos, uma gestora de recursos e uma empresa de meios de pagamento, além de negócios nos segmentos imobiliário e energético, nasceu com objetivo bem claro: investir em empresas do agronegócio, de preferência, em ativos estressados, que envolvem empresas em recuperação judicial ou em dificuldades financeiras.
Dentro das companhias do agro, foco inicial está na área de proteína animal. O primeiro deal foi fechado no último dia 30 de abril. Nessa data, a Fictor anunciou que o administrador judicial do processo de recuperação judicial da empresa Mellore Alimentos, de Minas Gerais, considerou a companhia como vencedora em um edital de venda de uma unidade produtiva na cidade de Betim (MG).
Esse foi apenas o primeiro passo da companhia no setor de proteínas. De olho em oportunidades nos segmentos de avicultura e piscicultura, a Fictor busca novos alvos para aquisição até o fim de 2025.
No caso dos aviários, a Fictor avalia que a crise provocada pela gripe aviária, após a confirmação de um caso em uma granja comercial de Montenegro (RS) em maio passado, pode ter criado um ambiente propício para a empresa.
“Empresas que são do ramo de avicultura no Brasil, se já não estava mal das pernas, ficaram. Isso trouxe uma oportunidade muito interessante de aquisição pela Fictor Alimentos”, diz André Vasconcellos, diretor de estratégia e relações com investidores da Fictor Alimentos, econômico nos detalhes.
Na piscicultura, a estratégia é aproveitar um espaço deixado pelos grandes frigoríficos, que priorizam bovinos, suínos e aves.
“Quando olhamos para a nova conjuntura, com MRBF, Minerva Foods e JBS, percebemos que eles priorizam muito suínos, bovinos e aves. Nenhuma dessas empresas prioriza a pisicultura”, analisa Vasconcellos.
Por mais que o setor de pescados e frutos do mar seja menos volátil em comparação aos demais ramos do mercado de proteínas – e, portanto, fugiria da tese de investimento em ativos estressados –, a pisicultura tem chamado a atenção da Fictor Alimentos pela sua abrangência.
“Temos um litoral muito extenso, produções de cativeiro e uma extensa capacidade de captação no Brasil, uma área muito oportuna para explorar esse setor que outras empresas não têm olhado.”, enumera Vasconcellos.
A companhia tem analisado possibilidades especialmente em empresas familiares e com resultados auditados por uma das grandes empresas de auditoria do mercado, as big fours.
O foco específico nas empresas familiares se dá porque esse tipo de companhia geralmente tem muita experiência em seu setor.
“Já há todo um trabalho bem montado, de know-how da criação e cultivo daqueles produtos de piscicultura. Para a gente, é um ponto bem interessante para se desenvolver”, explica Vasconcellos.
Além disso, o diretor da Fictor explica que a companhia leva vantagem ao negociar a compra de outras empresas por não ter feito uma série de aquisições, que poderiam levar a questionamentos do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE), o órgão antitruste brasileiro, por concentração de mercado.
“Temos uma facilidade de tramitação mais acelerada, mais otimizada, dentro de todas as alçadas que envolvem o nosso ambiente regulado”, analisa Vasconcellos.
Outra mudança relevante foi a ampliação do objeto social da companhia, aprovada em assembleia em abril deste ano. Antes restrita à criação e processamento de aves, pescados e frutos do mar, a Fictor passou a incluir também suínos e bovinos em seu escopo de atuação.
Foi o que abriu as portas para a aquisição da planta de suínos e bovinos que pertencia à Mellore Alimentos por R$ 30,9 milhões.
A Fictor havia apresentado proposta única para a compra da unidade produtiva, focada em suínos, que tem habilitação para exportar para 100 países, com possibilidade de remeter para Emirados Árabes Unidos, Catar e Hong Kong, e capacidade de produzir 1.691 toneladas por mês de produtos acabados de origem animal.
A Fictor não adquiriu o controle da Mellore, apenas o ativo que pertencia à companhia, livre de passivos, e que já teve o aval do administrador judicial, aguardando apenas a sentença judicial para a transferência de controle.
O processo corre na Vara Empresarial, da Fazenda Pública e Autarquias, de Registros Públicos e de Acidentes do Trabalho da Comarca de Betim.
No momento, a planta segue operando, já com investimentos feitos pela Fictor, que envolve parte dos valores investidos. “O juiz autorizou que a gente pudesse executar a gestão daquele ativo para que ele não depreciasse mais”, explica Vasconcellos.
“Estamos fazendo desembolsos para realizar investimentos necessários, para que a planta tenha condições mínimas para se perpetuar e operar. Nossa ideia é apresentar ao juízo todos os desembolsos que são feitos, das mais diversas naturezas, para que eles façam parte de uma eventual dedução, quando acontecer o pagamento efetivo pela aquisição do ativo”, emenda o diretor de RI.
Há a possibilidade de um aumento de capital da companhia ainda neste ano, visando recursos para novas aquisições.
De todo o capital acioniário da Fictor Alimentos, 76% está nas mãos da Fictor, sendo que 49% pertencem à Fictor Holding e 30,6% estão com a holding americana Aqwa Capital.
Os 23,49% restantes correspondem à ações em circulação, com 5.043 acionistas. “A maioria deles é formada por pessoas físicas”, diz Vasconcellos. “Agora, a gente passou a ter um interesse maior de fundos, alguns investidores institucionais e, mais recentemente, alguns fundos multimercados.”
Ao longo dos últimos seis meses, a ação, negociada sob o ticker FICT3, acumulou alta de 10,51%, tendo alcançado um pico de R$ 4,51 em 17 de fevereiro.
Resumo
- Com foco na aquisição de ativos e empresas do agro em dificuldades, Fictor Alimentos estreou na B3 no ano passado, após aquisição do controle da Atom Participações
- Exemplo da estratégia foi a aquisição de uma planta de suínos da Mellore Allimentos, em Betim (MG), por R$ 30,9 milhões
- De olho em novas aquisições até o fim de 2025, empresa mira oportunidades na avicultura e na piscicultura
A Estratégia de Aquisições da Fictor Alimentos
A Fictor Alimentos tem demonstrado uma estratégia agressiva de crescimento por meio de aquisições, mirando empresas do setor agroalimentar que se encontram em situações financeiras delicadas. Essa abordagem permite à empresa expandir sua atuação de forma rápida e eficiente, aproveitando ativos já existentes e integrando novas operações ao seu portfólio. A recente aquisição de uma unidade produtiva da Mellore Alimentos, em recuperação judicial, é um exemplo claro dessa estratégia, demonstrando a capacidade da Fictor em identificar oportunidades e concretizar negócios vantajosos.
A empresa busca ativamente por ativos “estressados”, ou seja, empresas que enfrentam dificuldades financeiras ou estão em processo de recuperação judicial. Essa abordagem permite à Fictor adquirir ativos a preços mais competitivos, com potencial de valorização após a implementação de melhorias e otimizações. A experiência da equipe de gestão em reestruturação de empresas e a solidez financeira do grupo são fatores cruciais para o sucesso dessa estratégia, garantindo a capacidade de transformar ativos problemáticos em negócios rentáveis.
Expansão para Avicultura e Piscicultura
Além da aquisição da planta de suínos da Mellore Alimentos, a Fictor Alimentos está de olho em oportunidades nos segmentos de avicultura e piscicultura. A empresa avalia que a crise provocada pela gripe aviária pode ter criado um ambiente favorável para aquisições no setor de aves, enquanto a piscicultura apresenta um potencial de crescimento inexplorado pelos grandes frigoríficos. A diversificação para esses segmentos permitirá à Fictor ampliar sua oferta de produtos e reduzir sua dependência de um único mercado, tornando a empresa mais resiliente e competitiva.
A estratégia de expansão para avicultura e piscicultura está alinhada com a visão de longo prazo da Fictor Alimentos, que busca se tornar uma das principais empresas do setor de proteína animal no Brasil. A empresa pretende aproveitar as sinergias entre os diferentes segmentos, otimizando seus processos produtivos e ampliando sua rede de distribuição. A busca por empresas familiares com experiência no setor de piscicultura é um exemplo da abordagem criteriosa da Fictor na identificação de alvos para aquisição, buscando empresas com know-how e potencial de crescimento.
Oportunidades e Desafios na Avicultura
A avicultura brasileira enfrenta desafios significativos, especialmente após a confirmação de casos de gripe aviária em granjas comerciais. Essa crise gerou incertezas no mercado, afetando a produção e as exportações de carne de frango. No entanto, a Fictor Alimentos enxerga essa situação como uma oportunidade para adquirir empresas do setor que se encontram em dificuldades financeiras. A empresa pretende aproveitar a sua expertise em gestão e reestruturação para revitalizar essas empresas e torná-las mais competitivas.
Apesar das oportunidades, a entrada no mercado de avicultura também apresenta desafios. A concorrência é acirrada, com grandes empresas dominando o setor. Além disso, a Fictor Alimentos precisará investir em medidas de biosseguridade para proteger seus aviários contra a gripe aviária e outras doenças. A empresa também terá que lidar com as flutuações nos preços dos insumos, como milho e soja, que representam uma parte significativa dos custos de produção. Superar esses desafios será fundamental para o sucesso da Fictor no mercado de avicultura.
Potencial da Piscicultura no Brasil
A piscicultura brasileira apresenta um grande potencial de crescimento, impulsionado pela crescente demanda por peixes e frutos do mar tanto no mercado interno quanto no externo. O Brasil possui um extenso litoral, condições climáticas favoráveis e recursos hídricos abundantes, o que o torna um país com grande potencial para a produção de peixes em cativeiro. No entanto, o setor ainda enfrenta desafios, como a falta de investimentos em tecnologia e infraestrutura, a burocracia excessiva e a dificuldade de acesso ao crédito.
A Fictor Alimentos pretende aproveitar as oportunidades no mercado de piscicultura, investindo em empresas familiares com experiência no setor. A empresa busca empresas que já possuam um know-how consolidado na criação e cultivo de peixes, mas que necessitem de investimentos para expandir sua produção e melhorar sua eficiência. A Fictor pretende aplicar sua expertise em gestão e reestruturação para otimizar os processos produtivos dessas empresas e torná-las mais competitivas no mercado nacional e internacional.
Aspectos Regulatórios e Financeiros
Ampliação do Objeto Social e Aval do CADE
A ampliação do objeto social da Fictor Alimentos, aprovada em assembleia, permitiu à empresa expandir sua atuação para além da criação e processamento de aves, pescados e frutos do mar, incluindo também suínos e bovinos. Essa mudança estratégica abriu as portas para a aquisição da planta da Mellore Alimentos e demonstra a visão de longo prazo da empresa em se tornar uma das principais players do setor de proteína animal no Brasil. A Fictor também acredita que a sua situação como uma empresa com poucas aquisições anteriores pode facilitar a aprovação de futuras aquisições pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE), o órgão antitruste brasileiro.
A aprovação de aquisições pelo CADE é um passo fundamental para a Fictor Alimentos, pois garante que as operações não configurem concentração de mercado e não prejudiquem a concorrência. A empresa busca manter uma postura transparente e colaborativa com o órgão regulador, apresentando todas as informações necessárias e demonstrando que suas aquisições visam a revitalização de empresas em dificuldades, gerando empregos e renda para a sociedade.
Estrutura Acionária e Possível Aumento de Capital
A estrutura acionária da Fictor Alimentos é composta por 76% de capital pertencente à Fictor, sendo 49% da Fictor Holding e 30,6% da holding americana Aqwa Capital. Os 23,49% restantes correspondem a ações em circulação, com um número considerável de acionistas pessoas físicas. A empresa tem atraído o interesse de fundos de investimento, investidores institucionais e fundos multimercado, o que demonstra a confiança do mercado no potencial de crescimento da Fictor Alimentos.
A Fictor Alimentos considera a possibilidade de realizar um aumento de capital ainda neste ano, visando obter recursos para financiar novas aquisições. Essa estratégia permitiria à empresa acelerar seu plano de expansão e consolidar sua posição no mercado de proteína animal. A decisão de realizar ou não o aumento de capital dependerá das condições do mercado e das oportunidades de aquisição que surgirem nos próximos meses. A empresa busca manter uma gestão financeira prudente e responsável, garantindo a sustentabilidade de seus negócios a longo prazo.
Impacto da Aquisição da Mellore Alimentos
A aquisição da unidade produtiva da Mellore Alimentos representa um marco importante na estratégia de crescimento da Fictor Alimentos. A planta, localizada em Betim (MG), possui habilitação para exportar para 100 países e tem capacidade de produzir 1.691 toneladas por mês de produtos acabados de origem animal. Essa aquisição permite à Fictor entrar no mercado de suínos e bovinos, ampliando sua oferta de produtos e diversificando suas fontes de receita.
A Fictor Alimentos está investindo na revitalização da planta da Mellore Alimentos, realizando desembolsos para garantir que a unidade tenha condições mínimas para operar de forma eficiente. A empresa busca apresentar ao juízo todos os investimentos realizados, para que eles façam parte de uma eventual dedução no pagamento efetivo pela aquisição do ativo. A Fictor acredita que a aquisição da Mellore Alimentos trará sinergias importantes para seus negócios, contribuindo para o crescimento e a rentabilidade da empresa.
Futuras Perspectivas
A Fictor Alimentos demonstra um forte compromisso com o crescimento e a expansão no setor de proteína animal. A empresa está atenta às oportunidades de aquisição que surgem no mercado, buscando ativos “estressados” com potencial de valorização. A estratégia de diversificação para os segmentos de avicultura e piscicultura permitirá à Fictor ampliar sua oferta de produtos e reduzir sua dependência de um único mercado. A empresa busca consolidar sua posição como uma das principais players do setor, gerando valor para seus acionistas e contribuindo para o desenvolvimento do agronegócio brasileiro.
O sucesso da Fictor Alimentos dependerá da sua capacidade de executar sua estratégia de aquisições de forma eficiente, integrando as novas empresas ao seu portfólio e otimizando seus processos produtivos. A empresa também precisará lidar com os desafios do mercado, como a concorrência acirrada, as flutuações nos preços dos insumos e as questões regulatórias. Com uma gestão experiente e uma visão de longo prazo, a Fictor Alimentos tem potencial para alcançar seus objetivos e se tornar uma referência no setor de proteína animal no Brasil.