Frigorífico nega socorro e trabalhadora perde gêmeas em SC, diz sindicato.

Frigorífico nega socorro e trabalhadora perde gêmeas em SC, diz sindicato.

Trabalhadora perde gêmeas após ter socorro negado em frigorífico

A 2ª Vara da Justiça do Trabalho de Lucas do Rio Verde (MT) condenou a BRF, gigante do setor alimentício dona das marcas Sadia e Perdigão, a pagar R$ 150 mil de indenização por danos morais a uma funcionária que perdeu suas filhas gêmeas após entrar em trabalho de parto nas dependências de um frigorífico. A decisão judicial aponta omissão e negligência da empresa em prestar o devido socorro à trabalhadora, uma imigrante venezuelana.

Entenda a Decisão Judicial

O juiz Fernando Galisteu, responsável pelo caso, fundamentou sua decisão na comprovação de que o supervisor da trabalhadora impediu que ela deixasse seu posto de trabalho, priorizando a manutenção da linha de produção em detrimento da saúde e bem-estar da gestante. Essa atitude foi considerada negligente e determinante para o trágico desfecho.

A sentença judicial não apenas condenou a BRF ao pagamento de indenização por danos morais, mas também reconheceu a rescisão indireta do contrato de trabalho. Isso significa que a Justiça entendeu que a trabalhadora teve motivos para “demitir” a empresa, garantindo a ela o direito a verbas rescisórias como aviso prévio indenizado, 13º salário, férias proporcionais e integrais (se houver), além do acesso ao saldo do FGTS com a multa de 40% e o seguro-desemprego. Essa medida visa amparar a trabalhadora neste momento de vulnerabilidade.

O Contexto do Trágico Evento

O caso ocorreu em abril de 2024, quando a trabalhadora, grávida de oito meses de gêmeas, começou a sentir fortes dores, náuseas, tontura e falta de ar no início de sua jornada de trabalho, por volta das 3h40 da manhã. Desesperada, ela buscou ajuda de sua líder imediata e do supervisor, relatando seu estado de saúde e a necessidade urgente de atendimento médico.

Apesar dos repetidos pedidos de socorro, a trabalhadora foi mantida em seu posto, sob a alegação de que sua ausência prejudicaria o ritmo da linha de produção. Diante da negativa e do agravamento de seu quadro clínico, a gestante tentou, por conta própria, buscar ajuda médica, mas não conseguiu chegar a tempo. Ela acabou dando à luz a primeira filha em um ponto de ônibus, enquanto aguardava uma condução para o hospital. Infelizmente, a bebê não resistiu e faleceu logo em seguida. Poucos minutos depois, a mesma tragédia se repetiu com a segunda gêmea.

A Defesa da BRF e as Contradições

Em sua defesa, a BRF alegou que o parto ocorreu fora de suas instalações e que a trabalhadora teria se recusado a receber atendimento médico no setor interno do frigorífico, argumentando que a negligência seria da própria venezuelana. A empresa tentou se eximir da responsabilidade, transferindo a culpa para a vítima.

Entretanto, a versão da BRF foi confrontada por provas irrefutáveis apresentadas no processo. Gravações das câmeras de segurança internas, fornecidas pela própria defesa da empresa, revelaram que o parto ocorreu nas dependências do frigorífico, desmentindo a alegação inicial. Além disso, testemunhas da própria defesa admitiram que a gestante não teve acesso ao SESMT (Serviço Especializado em Engenharia de Segurança e em Medicina do Trabalho), um serviço obrigatório previsto em norma interna da empresa.

O Papel do SESMT e a Falha no Atendimento

O enfermeiro responsável pela área médica do frigorífico confirmou que o protocolo de atendimento não foi seguido e a técnica de saúde presente no local afirmou que não recebeu nenhuma comunicação sobre a situação da trabalhadora. Essas declarações reforçam a negligência da empresa em prestar o devido socorro à gestante, evidenciando a falha nos procedimentos internos e a falta de preparo para lidar com emergências médicas.

A ausência de atendimento médico adequado e a demora em prestar socorro à trabalhadora foram determinantes para o trágico desfecho, culminando na perda das duas filhas gêmeas. A negligência da empresa em priorizar a produção em detrimento da saúde e bem-estar de sua funcionária gerou um sofrimento imensurável e configurou um grave dano moral.

A Perspectiva de Gênero e a Vulnerabilidade da Trabalhadora

A advogada Flávia Polycarpo, especialista em direito do trabalho, ressalta que a decisão judicial está tecnicamente bem fundamentada e comprova um caso grave de dano moral. Ela destaca a tendência do Tribunal Superior do Trabalho (TST) em aumentar o valor das indenizações em casos semelhantes, especialmente quando há agravantes como a vulnerabilidade da vítima.

O caso em questão envolve uma trabalhadora imigrante, mulher e gestante, o que a coloca em uma situação de ainda maior vulnerabilidade. A aplicação do Protocolo de Julgamento com Perspectiva de Gênero, que considera essas questões, reforça a necessidade de uma análise mais rigorosa e uma reparação mais justa para a vítima. O juiz da causa considerou o protocolo e também citou, em sua decisão, a Constituição Federal e tratados internacionais da OIT (Organização Internacional do Trabalho), destacando que as normas relativas à saúde e segurança no trabalho são de ordem pública, de observância indispensável e com prioridade absoluta.

Repercussão e o Posicionamento da BRF

A decisão judicial teve ampla repercussão na mídia e gerou indignação em diversos setores da sociedade. A empresa recorreu ao Tribunal Regional do Trabalho (TRT) e aguarda o julgamento do recurso. Em nota oficial, a BRF afirmou que não comenta processos judiciais em andamento, mas ressaltou que criou um comitê interno para apurar o caso e tomar as medidas cabíveis.

A imagem da BRF foi fortemente abalada pelo caso, especialmente em um momento em que a empresa investe em campanhas publicitárias focadas na valorização da figura materna. A multinacional, por meio de sua marca Sadia, lançou uma campanha especial para o Dia das Mães intitulada “Ser mãe é ouro”, com o objetivo de ressaltar os desafios da maternidade e a importância das mães na vida de seus filhos. A contradição entre o discurso da empresa e a realidade dos fatos gerou críticas e questionamentos sobre a sua responsabilidade social.

Investimentos em Imagem e a Realidade nos Frigoríficos

A BRF se apresenta como uma das maiores empregadoras de imigrantes e refugiados no Brasil, com mais de 11,5 mil estrangeiros atuando em suas operações. No entanto, o caso da trabalhadora venezuelana expõe as condições precárias de trabalho e a falta de segurança enfrentadas por muitos desses trabalhadores, especialmente em setores como o frigorífico, onde a pressão por produtividade é alta e os riscos à saúde são constantes.

A ocorrência deste trágico evento lança luz sobre a necessidade urgente de fiscalização e cumprimento das normas de saúde e segurança do trabalho nos frigoríficos, bem como a importância de garantir um ambiente de trabalho digno e respeitoso para todos os trabalhadores, independentemente de sua nacionalidade ou condição social. É fundamental que as empresas priorizem a vida e a saúde de seus funcionários, em vez de colocar o lucro acima de tudo.

O Cenário da Indústria Alimentícia e a Saúde do Trabalhador

O caso da trabalhadora da BRF não é um incidente isolado. A indústria alimentícia, especialmente o setor de frigoríficos, é frequentemente palco de denúncias de condições de trabalho precárias, jornadas exaustivas, assédio moral e riscos à saúde dos trabalhadores. A alta demanda por produção e a busca por redução de custos muitas vezes levam as empresas a negligenciarem a segurança e o bem-estar de seus funcionários.

Estudos e pesquisas têm demonstrado que os trabalhadores de frigoríficos estão expostos a diversos riscos, como acidentes de trabalho, doenças ocupacionais, problemas de saúde mental e lesões por esforços repetitivos (LER). A pressão por produtividade, a exigência de ritmos acelerados e a falta de pausas adequadas contribuem para o aumento do estresse e da fadiga, elevando o risco de acidentes e doenças.

A Necessidade de Fiscalização e Legislação Mais Rigorosas

Diante desse cenário preocupante, é imprescindível que as autoridades competentes intensifiquem a fiscalização e o controle das condições de trabalho nos frigoríficos, garantindo o cumprimento das normas de saúde e segurança e punindo as empresas que descumprirem a legislação. Além disso, é necessário fortalecer a legislação trabalhista, tornando-a mais rigorosa e eficaz na proteção dos direitos dos trabalhadores.

É fundamental que a sociedade como um todo se mobilize para exigir melhores condições de trabalho e mais respeito aos direitos dos trabalhadores da indústria alimentícia. Os consumidores podem exercer um papel importante nesse processo, optando por consumir produtos de empresas que se preocupam com o bem-estar de seus funcionários e que adotam práticas de produção sustentáveis e responsáveis.

Responsabilidade Social Corporativa e a Ética nos Negócios

O caso da BRF levanta importantes questões sobre a responsabilidade social corporativa e a ética nos negócios. As empresas têm o dever de ir além do cumprimento das leis e regulamentos, adotando práticas que promovam o bem-estar de seus funcionários, o respeito aos direitos humanos e a proteção do meio ambiente. A responsabilidade social não deve ser vista como um custo, mas sim como um investimento no futuro da empresa e da sociedade.

Uma empresa socialmente responsável é aquela que se preocupa com o impacto de suas atividades em todos os seus stakeholders, incluindo funcionários, clientes, fornecedores, comunidades e o meio ambiente. Ela adota práticas transparentes e éticas, promove a diversidade e a inclusão, investe em programas sociais e ambientais e busca soluções inovadoras para os desafios do desenvolvimento sustentável.

O Impacto da Imagem e a Percepção do Consumidor

A imagem de uma empresa socialmente responsável tem um impacto significativo na percepção dos consumidores e na sua decisão de compra. Os consumidores estão cada vez mais conscientes e exigentes, buscando produtos e serviços de empresas que compartilham seus valores e que demonstram um compromisso com a sustentabilidade e a justiça social. Uma empresa que negligencia a saúde e o bem-estar de seus funcionários corre o risco de perder a confiança dos consumidores e de sofrer um impacto negativo em seus resultados financeiros.

O caso da BRF serve como um alerta para as empresas de todos os setores. A negligência e a falta de ética nos negócios podem ter consequências devastadoras, não apenas para as vítimas, mas também para a reputação e a sustentabilidade da empresa. É fundamental que as empresas repensem suas práticas e adotem uma postura mais responsável e comprometida com o bem-estar de todos os seus stakeholders.

Lições Aprendidas e o Futuro das Relações de Trabalho

O trágico caso da trabalhadora da BRF deixa importantes lições para a sociedade e para o mundo do trabalho. É preciso repensar as prioridades e valores que norteiam as relações de trabalho, colocando a vida e a dignidade humana acima do lucro e da produtividade. É fundamental que as empresas invistam em programas de saúde e segurança do trabalho, promovam um ambiente de trabalho saudável e respeitoso e garantam o cumprimento das normas trabalhistas.

O futuro das relações de trabalho passa pela construção de um modelo mais justo e equilibrado, onde os direitos dos trabalhadores sejam respeitados e onde as empresas atuem de forma socialmente responsável. É preciso fortalecer o diálogo social, promover a negociação coletiva e garantir a participação dos trabalhadores nas decisões que afetam suas vidas. Somente assim será possível construir um futuro onde o trabalho seja sinônimo de dignidade, bem-estar e desenvolvimento para todos.





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