Frigoríficos apostam em novas raças bovinas para atender demanda

Frigoríficos apostam em novas raças bovinas para atender demanda

Frigoríficos apostam em novas raças para atender demanda

No Sudoeste do Paraná, a indústria da carne vive um momento de ajuste fino. Frigoríficos regionais ampliam a compra de animais de raças britânicas e europeias para atender consumidores que passaram a valorizar marmoreio e maciez, sem abrir mão do sabor marcante associado às raças zebuínas. O movimento não substitui o Nelore, tradicional na região, mas cria duas prateleiras claras: cortes com perfil de sabor mais intenso, comuns em bovinos criados majoritariamente a pasto, e produtos certificados com foco em textura e gordura entremeada.

Os números mostram a força do setor. Em 2023, o Sudoeste do Paraná registrou cerca de 338 mil abates e movimentou aproximadamente R$ 923 milhões, de acordo com o Valor Bruto da Produção. No acumulado estadual, o Paraná ultrapassou 2 milhões de cabeças abatidas, com giro próximo de R$ 12 bilhões. Nesse contexto, empresas como a Frispar, de Marmeleiro, passaram a organizar a compra, o abate e a distribuição para atender dois públicos simultâneos: quem busca cortes de alto padrão, com certificação de origem e requisitos de carcaça mais rigorosos, e quem mantém preferência pela carne de animais zebuínos.

Empresário do setor afirma que, no Sudoeste, o consumidor ainda prefere o sabor tradicional das raças zebuínas, como o Nelore, mas tem crescido a busca por carnes de Angus e Hereford, valorizadas pelo marmoreio e pela maciez dos cortes.

Perfil de consumo: sabor de zebu e avanço do marmoreio

A preferência histórica da região passou décadas associada ao Nelore e a outros zebuínos. O consumidor descreve essa carne como “mais saborosa”, percepção influenciada por fatores como alimentação predominante a pasto, idade de abate e cobertura de gordura externa, com coloração amarelada frequente em determinados sistemas de criação. Esse perfil tem alta aceitação em açougues de bairro e redes regionais, principalmente para churrasco e cortes de cocção lenta, nos quais o sabor concentrado se destaca.

Ao mesmo tempo, ganhou espaço uma nova demanda: cortes com maior marmoreio intramuscular, associados a raças britânicas como Angus, Hereford, Shorthorn e Devon. Nesses animais, a gordura entremeada nas fibras contribui para maciez e suculência, atributo valorizado em steaks de preparo rápido, como ancho e chorizo. A tendência criou nichos de mercado e levou frigoríficos a segmentar linhas de compra, classificação e rotulagem para comunicar melhor as diferenças ao consumidor final.

Como os frigoríficos ajustam a compra e o abate

A estratégia começa no curral de negociação. Empresas passaram a divulgar com mais clareza as exigências de acabamento de gordura, idade e peso de carcaça para os diferentes programas. No caso da Frispar, a operação combina metas de qualidade com a realidade da oferta regional. A empresa abate, em média, 500 bovinos por semana — cerca de 2 mil por mês, somando aproximadamente 24 mil por ano. O número é considerado robusto para o porte da indústria no Sudoeste e exige planejamento de escala de abate, resfriamento e expedição compatíveis com prazos de entrega para supermercados e atacarejos.

A base de fornecimento inclui mais de 250 produtores, distribuídos pelo Sudoeste e áreas vizinhas. Parte dos animais chega em frota própria; outra parte é entregue pelos pecuaristas. O gargalo logístico mais citado segue nas estradas rurais, que demandam manutenção contínua para evitar perdas de tempo e de qualidade no transporte. Com o volume equilibrado entre animais zebuínos, cruzados e de descarte leiteiro, o frigorífico organiza o calendário para separar lotes destinados ao mercado geral e aos programas premium, que pedem padronização mais rígida no peso e na cobertura de gordura.

Cruzamentos, acabamento e impacto na carcaça

O avanço de raças britânicas não significa abandonar o zebu. A prática mais comum tem sido a de cruzamentos que combinam rusticidade, eficiência de ganho de peso e qualidade de carcaça. Acasalamentos de touros Angus ou Hereford sobre matrizes Nelore, por exemplo, elevam a chance de marmoreio e maciez por meio da heterose, mantendo adaptação e boa conversão em sistemas a pasto com suplementação. O resultado aparece na balança e no corte transversal do músculo: distribuição de gordura intramuscular mais visível e cobertura uniforme, atributos que favorecem a classificação e eventuais bonificações.

Além da genética, o acabamento final pesa na decisão de compra do frigorífico. Animais jovens, com idade alvo bem definida e camada de gordura de espessura adequada, tendem a apresentar rendimento de carcaça estável e menor variabilidade no resfriamento. Em programas premium, esse acabamento é condição para manter textura e suculência após o preparo, sobretudo em cortes de cocção rápida. Já no mercado tradicional, a prioridade costuma ser o sabor e o rendimento de cortes populares, com tolerância maior a oscilações de marmoreio desde que o peso por peça atenda a padronização do varejo.

Do curral ao resfriamento: etapas que fazem diferença

O pré-abate começa com jejum controlado, normalmente entre seis e oito horas, e água à vontade no período de descanso. Essa rotina reduz riscos operacionais e ajuda a preservar a qualidade da carne. Ao chegar ao frigorífico, os lotes seguem para currais de espera dimensionados para evitar superlotação. O manejo calmo, com mínima agitação, diminui perdas e contribui para um fluxo contínuo de trabalho nas áreas de insensibilização, sangria e retirada do couro, etapas que exigem equipes treinadas e checagem permanente de temperatura e higiene.

Depois da evisceração e da lavagem, as meias-carcaças entram em câmaras de resfriamento com controle estreito de tempo e temperatura. A meta é padronizar pH e perda por gotejamento, condições que influenciam diretamente a maciez percebida pelo consumidor. A classificação visual registra sexo, peso e acabamento, além de observações sobre contusões ou variações de cor. Em linhas premium, o frigorífico também registra o marmoreio com critérios definidos pelo programa, para segregar carcaças que atendem às exigências de cortes mais nobres.

Certificações, SISBI e rotulagem que orienta a compra

A expansão de programas de qualidade depende de regras claras de inspeção e rotulagem. O SISBI permite que produtos com inspeção municipal ou estadual, quando habilitados, circulem entre estados com a mesma segurança sanitária e rastreabilidade exigidas no escopo federal. Na prática, esse selo amplia o mercado potencial de frigoríficos regionais, viabilizando envios frequentes para capitais e destinos turísticos sem a necessidade de reprocessamento em plantas de terceiros.

No Sudoeste, há destaque para certificações de raças britânicas, como o selo Hereford. Programas desse tipo elevam a transparência para o consumidor, que passa a reconhecer no rótulo critérios de idade, acabamento e padrão de carcaça. Para o produtor, abre-se uma trilha de bonificações atreladas a lotes jovens e bem terminados. Para o varejo, a rotulagem facilita a montagem da gôndola com linhas diferenciadas — do corte clássico para churrasco, lembrado pelo sabor mais intenso, até o steak com foco em marmoreio.

A rota da carne: onde a produção chega e o que define o preço

Uma fração relevante dos cortes processados no Sudoeste é consumida na própria região, mas a rede de distribuição inclui Curitiba, o litoral paranaense, Santa Catarina e o Rio Grande do Sul. O selo SISBI facilita a venda interestadual com controle padronizado. Embora algumas plantas ainda não exportem diretamente, parte dos volumes chega ao exterior via clientes que industrializam e embarcam a proteína adquirida localmente. Essa triangulação amplia a demanda por carcaças bem classificadas, mesmo quando o envio internacional ocorre por parceiros.

Do lado da formação de preço, três variáveis se repetem: oferta de animais jovens e terminados, custo de insumos e logística. O calendário regional influencia o número de lotes prontos, enquanto ração e suplementos ajustam o custo de produção. No frete, a condição das estradas afeta a previsibilidade. Para o produtor, a leitura prática é clara: quando há demanda por programas de qualidade e oferta limitada de animais dentro do padrão, a saca do boi bem terminado tende a ser valorizada. Já nos períodos de maior oferta, o giro do volume regular mantém a linha tradicional de cortes.

Guia prático: como o produtor entra no nicho premium

O primeiro passo é alinhar genética, manejo e cronograma de terminação com as regras do programa desejado. Em cruzamentos com base zebuína, touros britânicos costumam elevar a chance de marmoreio. Na cria e recria, ganho de peso constante evita atrasos que comprometem idade de abate. Na terminação, ajuste de dieta e manejo de cocho dá o acabamento necessário sem excesso de gordura externa. Um planejamento de escore corporal por lotes, antecipado em 60 a 90 dias, ajuda a fechar o calendário de venda com o frigorífico.

Documentação e rastreabilidade também contam. Registros de origem, sexo, idade e tratamentos sanitários reduzem dúvidas na compra. Antes do embarque, simulação de peso e conferência da cobertura de gordura evitam recusa por falta de padrão. Por fim, é importante negociar a forma de pagamento: muitos programas trabalham com grade de bonificação por peso de carcaça e acabamento. Conhecer essa grade e projetar o desempenho do lote aumenta a chance de aproveitar o prêmio.

  • Genética: escolha reprodutores com histórico de marmoreio e crescimento.
  • Idade: alinhe janela de abate a programas que exigem animais jovens.
  • Acabamento: persiga cobertura uniforme de gordura e peso de carcaça estável.
  • Manejo: minimize estresse pré-embarque para preservar qualidade de carne.
  • Negociação: entenda a grade de bonificação e combine lotes homogêneos.

Para o consumidor: como escolher cortes e entender rótulos

Rótulos trazem pistas úteis. Em linhas premium, a indicação de raça ou de programa de qualidade informa que a carcaça passou por critérios de idade, acabamento e, em alguns casos, padrões mínimos de marmoreio. Já na carne tradicional, a classificação de peso e cobertura de gordura orienta o uso culinário. Para bife rápido, como contra-filé, bife de chorizo e picanha, procure fibras finas e presença visível de gordura entremeada. Para panela, cortes com mais tecido conjuntivo, como acém e paleta, entregam sabor e ficam macios com cozimento prolongado.

Conservação e preparo completam a experiência. No transporte até casa, mantenha a carne refrigerada; ao chegar, armazene em temperatura adequada e observe a data de validade. Para grelhar, retire a peça da geladeira alguns minutos antes, seque a superfície e sele em fogo alto para preservar suculência. Em assados mais longos, a gordura externa ajuda a proteger o corte. Ler o rótulo e entender a proposta do produto — sabor mais pronunciado ou maciez reforçada pelo marmoreio — evita frustração e orienta a escolha conforme a ocasião.

Tecnologia no campo e no frigorífico: padronização como meta

Ferramentas de identificação individual, balanças de curral com leitura rápida e aplicativos de manejo facilitaram o controle de ganho de peso por lote. Com esses dados, produtores antecipam a janela ideal de venda e evitam dispersão de pesos que derruba a média de carcaça no frigorífico. Em terminação, a medição periódica do escore de condição corporal orienta ajustes de dieta e reduz surpresas no embarque, elevando a taxa de aproveitamento em programas com exigências específicas.

Do lado industrial, sistemas que registram peso ao gancho, espessura de gordura e características visuais padronizam a classificação e alimentam painéis de acompanhamento. Nas linhas voltadas a cortes especiais, câmeras e protocolos fotográficos ajudam a documentar marmoreio e a segregar carcaças que atendem a requisitos de etiquetas de raça. O objetivo é simples: alinhar expectativa, reduzir variação e entregar ao varejo um produto uniforme, seja ele direcionado ao sabor mais marcado dos zebuínos, seja à maciez buscada nas britânicas.

– Publicidade –

Matriz produtiva do Sudoeste: papel da indústria regional

A bovinocultura integra a lista de atividades âncoras do Sudoeste do Paraná e movimenta elos que vão da venda de insumos à logística de distribuição. A presença de plantas de abate com inspeção habilitada sustenta o fluxo de animais prontos ao longo do ano, com repasses constantes ao varejo local e a mercados vizinhos. A cada semana, o encaixe entre oferta e programação de abate decide o destino de lotes: alguns seguem para linhas convencionais; outros entram em programas de certificação conforme o padrão exigido de carcaça e acabamento.

Essa engrenagem também tem um componente de comunicação. O produtor precisa saber, com antecedência, quais características serão valorizadas nas próximas semanas. O frigorífico, por sua vez, precisa sinalizar ao campo as janelas de maior demanda por animais jovens e bem terminados. Quando esse diálogo funciona, a taxa de aproveitamento sobe e o desperdício cai, porque menos carcaças fora do padrão são redirecionadas a linhas que não pagam bonificação. O resultado é um catálogo de produtos mais previsível para o varejo e mais compreensão para o consumidor sobre o que está comprando.

Classificação e grade de pagamento: onde mora a bonificação

A classificação da carcaça é o ponto de encontro entre expectativa do varejo e remuneração do produtor. As grades de pagamento costumam considerar peso ao gancho, sexo, idade aparente e cobertura de gordura. Em linhas premium, entram também critérios de raça e marmoreio. Carcaças acima ou abaixo do alvo saem do “miolo” da grade e tendem a receber menos. O recado para o campo é prático: lotes homogêneos, com acabamento e idade ajustados à demanda, concentram mais peças no centro da grade, onde ficam os melhores preços e eventuais bônus por programa.

Para reduzir variabilidade, frigoríficos estimularam pré-classificação no campo, com acompanhamento de escore corporal e estimativa de peso por fita ou balança móvel. A separação prévia em lotes uniformes facilita o embarque, diminui devoluções e favorece a previsibilidade de produção. Quando a comunicação inclui feedback de carcaça por produtor, a curva de aprendizado acelera e a aderência ao padrão cresce ao longo dos ciclos.

Cortes e usos: do churrasco à panela de pressão

O perfil de corte mais procurado nas gôndolas do Sudoeste ainda privilegia peças para churrasco e para preparo em casa no dia a dia. Picanha, maminha e fraldinha mantêm procura estável, enquanto cortes como ancho, chorizo e ribeye ganharam espaço em restaurantes e açougues que investem em linhas premium. No cozimento lento, acém, patinho e músculo seguem líderes, principalmente em receitas de panela de pressão e ensopados, nas quais colágeno e sabor se destacam após longo tempo no fogo.

Para aproveitar melhor, a regra é entender a estrutura do músculo. Fibras mais curtas e marmorizadas tendem a ser macias em alta temperatura e tempo curto. Fibras mais longas, com mais tecido conjuntivo, pedem calor moderado e tempo prolongado. Essa leitura não depende apenas de raça: dois animais da mesma origem podem gerar resultados diferentes conforme idade, acabamento e manejo pré-abate. O rótulo e a aparência da peça ajudam a ajustar a receita ao objetivo.

Passo a passo para organizar a venda do lote

Organizar a venda com antecedência reduz imprevistos. A rotina prática começa com a escolha do programa de destino e a checagem dos requisitos. Em seguida, o produtor levanta pesos e condição corporal do lote, separa animais fora do padrão e programa o ajuste de dieta para o acabamento final. Na semana do embarque, confere documentação e agenda o transporte, evitando picos de calor e períodos de estrada em piores condições. No pós-venda, solicita ao frigorífico o retorno de dados de carcaça para comparar com as metas iniciais.

Esse ciclo, repetido lote após lote, reduz custo por arroba e melhora o aproveitamento na grade. O mais importante é manter homogeneidade. Misturar animais muito diferentes no mesmo embarque tende a puxar a média para baixo e a diluir bonificações. Com pequenos ajustes de calendário e dieta, é possível transformar dois embarques medianos em um lote premium e outro de linha tradicional, cada qual atendendo melhor ao seu mercado.

  1. Defina o destino: mercado tradicional ou programa premium.
  2. Meça pesos e escore; separe lotes homogêneos.
  3. Ajuste dieta e finalize acabamento.
  4. Agende embarque e revise documentos.
  5. Solicite feedback de carcaça e compare com as metas.

Perguntas frequentes do campo e do balcão

Cruzar ou não cruzar? Para quem já domina a produção de zebuínos e atende ao mercado que busca sabor mais intenso, a decisão de cruzar deve considerar demanda local e capacidade de terminar animais jovens dentro do padrão do programa. Em regiões onde o varejo passou a exigir rótulos de raça e maciez consistente, o cruzamento com britânicas costuma acelerar a entrada em linhas de bonificação. Já em áreas com compra concentrada em cortes tradicionais, manter o foco no Nelore pode continuar competitivo, desde que a carcaça chegue bem acabada.

O consumidor paga mais por marmoreio? Em geral, sim, quando a proposta é clara e o corte está adequado à finalidade. Um steak de preparo rápido, com gordura entremeada visível, tende a valorizar o atributo e recebe etiqueta específica. Em cortes de panela, a disposição a pagar por marmoreio diminui e o preço volta a refletir mais o peso por peça e o rendimento culinário. A clareza no balcão — explicar o uso ideal e a diferença entre linhas — é tão importante quanto a padronização no abate.

Olhar para frente: padronização e diversidade de oferta

A tendência no Sudoeste do Paraná aponta para a convivência de duas praças sob o mesmo teto: a carne tradicional, de forte apelo de sabor, e a carne certificada, com ênfase em maciez e marmoreio. Frigoríficos estruturam linhas paralelas para atender às duas propostas, enquanto produtores organizam lotes por destino. Com a base de 2023 indicando volume consistente — 338 mil abates na região e mais de 2 milhões no estado —, a expectativa é de ampliação gradual da participação dos cortes premium, sem reduzir a relevância do produto clássico nas gôndolas e nas churrasqueiras locais.

Para os próximos ciclos, a chave passa por comunicação constante entre campo e indústria, bom planejamento de embarques e foco em uniformidade. Quem se preparar para atender aos requisitos de cada linha, com registro de dados e calendário previsível, tende a aproveitar melhor as janelas de mercado e a reduzir devoluções. No final, o consumidor encontra prateleiras mais organizadas e escolhas mais fáceis, seja para um almoço rápido com steak macio, seja para um churrasco de fim de semana com o sabor que virou marca da região.



Previous Article
Erros ao pedir empréstimo: o que evitar para reduzir riscos

Erros ao pedir empréstimo: o que evitar para reduzir riscos

Next Article
Safra 25/26: 354 mi t no radar — a supercolheita histórica que pode mexer nos preços e turbinar exportações

Safra 25/26: 354 mi t no radar — a supercolheita histórica que pode mexer nos preços e turbinar exportações

Related Posts