Panorama do estudo e do mercado
Um estudo da Embrapa Pesca e Aquicultura traçou um caminho objetivo para ampliar a presença da tilápia brasileira nos Estados Unidos e na Europa. O trabalho combina análise de consumo, custos logísticos, exigências regulatórias e preferências de compradores. O foco é transformar a força produtiva nacional em vendas consistentes e recorrentes nesses destinos, com metas claras por canal e produto. O levantamento contou com apoio da Associação Brasileira da Piscicultura (Peixe BR) e recursos de emendas parlamentares, e parte de um ponto favorável: o Brasil já é a quarta maior origem global de tilápia, com oferta regular e padrão de qualidade reconhecido por importadores.
Os números de demanda ajudam a entender por que o tema está na agenda do setor. Nos Estados Unidos, o consumo médio é de 460 gramas por habitante ao ano, com presença consolidada em varejo e food service. Na Europa, o consumo chega a 39 gramas per capita, concentrado em comunidades de origem latino-americana, asiática e africana. Esse contraste indica duas frentes distintas: manter e ampliar a participação no mercado norte-americano, que já conhece a espécie, e construir demanda no continente europeu, com posicionamento e comunicação voltados à qualidade e à conveniência do produto brasileiro.
EUA: resiliência diante das tarifas e espaço para crescer no congelado
Em agosto de 2025, primeiro mês de vigência do aumento de tarifas aplicado pelos Estados Unidos, os embarques brasileiros recuaram 32% em toneladas na comparação com agosto de 2024. O movimento foi menor do que muitos analistas previam, sinal de que a tilápia do Brasil manteve clientes ativos e capacidade de reação. O estudo da Embrapa destaca que a presença se sustenta, principalmente, na venda de filés frescos, já conhecida por distribuidores e restaurantes norte‑americanos que valorizam padronização, coloração clara e textura firme.
A oportunidade mais ampla, no entanto, está nos itens congelados. A base de consumo dos EUA é grande, e a janela de compra de filé e porções congeladas supera a de fresco em volume e capilaridade. Cadeias de supermercados operam planogramas anuais, trabalham contratos com entrega programada e exigem consistência de oferta. Para o Brasil, isso abre espaço para linhas de filé congelado IQF, porções padronizadas e cortes para food service com embalagens de fácil manuseio. A chave é competir com regularidade de entrega, planejamento de slot em armazéns e comunicação clara de especificações técnicas no rótulo e na ficha do produto.
No varejo, filés congelados de 140–170 g e 170–200 g atendem a famílias que buscam preparo rápido. Em restaurantes e redes de casual dining, porções de 85–120 g ganham espaço em sanduíches, bowls e pratos grelhados. Já em cantinas escolares e hospitais, a prioridade é padronização e controle de alérgenos. Em todos os casos, o comprador valoriza rendimento na cocção, ausência de off‑flavor e baixa variação de peso por peça, fatores diretamente ligados ao manejo e ao processamento na origem.
Para atenuar o efeito tarifário, o estudo sugere estratégias comerciais combinadas: contratos trimestrais com cláusulas de ajuste cambial, revisão de Incoterms para redistribuir custos logísticos e formação de estoques sazonais em centros de distribuição de parceiros americanos. Outra linha é ampliar a venda de itens de maior ticket, como cortes especiais e produtos com preparo simplificado, que suportam melhor a margem mesmo em cenários de tarifa mais alta.
Europa: como transformar oportunidade em demanda real
Na Europa, o consumo de tilápia ainda é baixo e concentrado em nichos. Isso não significa falta de espaço, e sim a necessidade de construir mercado. A avaliação da Embrapa é que o Brasil pode alavancar a boa reputação do filé fresco, apoiando‑se na malha aérea que conecta capitais brasileiras a hubs europeus. O objetivo é oferecer um produto de alta qualidade, com shelf life útil alinhado aos prazos de distribuição e exposição no varejo. O frescor é um diferencial em praças onde a categoria de peixes de carne branca já é comprada, mas a tilápia ainda não ocupa gôndolas de destaque.
A entrada passa por uma narrativa técnica: explicar cortes, rendimento e preparo, posicionar gramaturas ideais para receitas locais e demonstrar estabilidade sensorial. Demonstrações em loja e ativações com influenciadores de culinária ajudam a reduzir a barreira do “produto novo”. Em food service, menus de rede com preparação padronizada e fichas técnicas bilíngues aceleram a aceitação. O ponto central é competir com outros peixes de carne branca já populares, como bacalhau dessalgado, pescada e pangasius, destacando textura, versatilidade e consistência de fornecimento do Brasil ao longo do ano.
O estudo também identifica um fator conjuntural favorável: aumento de custos da tilápia chinesa, por conta de insumos e transporte. Isso melhora a competitividade do filé brasileiro, sobretudo em prateleiras onde o preço por quilo é comparado com produtos de aparência e rendimento similares. Para capturar esse momento, a recomendação é avançar com programas‑piloto em redes regionais, mensurar giro por SKU e ajustar gramaturas e embalagens com rapidez. A partir de resultados, ganha‑se escala e negocia‑se espaço permanente nas gôndolas.
A comunicação precisa ser objetiva. Fale de praticidade, corte sem espinhas aparentes e preparo em poucos minutos. Em mercados com forte cultura de congelados, como Reino Unido e países nórdicos, ofereça porções IQF com cobertura de gelo controlada e embalagem que destaque o rendimento após o descongelamento. Em praças mediterrâneas, vale apostar em fresco com giro rápido e parcerias com peixarias que valorizam apresentação e corte na hora.
Produto e padronização: especificações que abrem portas
Especificações claras reduzem devoluções e fortalecem a relação com o importador. Para filés frescos, padronize coloração branco‑perolada, miogelo firme, ausência de manchas e bolhas, e trim alinhado ao pedido do cliente (por exemplo, Trim C ou D, conforme a retirada de gordura e pequenas imperfeições). A variação de peso por peça deve ficar dentro do intervalo acordado para evitar perdas no porcionamento do comprador. A embalagem primária precisa ser inodora, com selagem limpa e lacre inviolável, e o gelo de cobertura deve ser suficiente para manter a temperatura alvo até a chegada ao destino.
Para congelados, a consistência do processo é decisiva. IQF deve garantir separação peça a peça e cobertura de gelo (glaze) entre 5% e 10%, conforme o contrato. O congelamento rápido reduz cristalização e preserva textura. Inclua no rótulo as informações exigidas, como lote, data de produção, data de congelamento, país de origem, método de produção, lista de ingredientes quando houver aditivos, e declaração de alérgenos quando aplicável. Códigos de barras e códigos de lote em padrão GS1 facilitam rastreio e recall, caso necessário. O cliente valoriza quando recebe uma ficha técnica com valores nutricionais, modo de preparo e tabela de calibres em português e inglês.
No food service, a clareza sobre rendimento é determinante. Informe perda média por gotejamento no descongelamento, rendimento após cocção e variação de peso por porção. Isso permite que redes definam preço de menu com segurança. Para redes que trabalham com fritura, ofereça linhas de empanados com cobertura estável, baixa absorção de óleo e perfil de crocância adequado a tempos de entrega por delivery. Em cozinhas que priorizam grelha, porções sem pele com espessura uniforme garantem resultado repetível e reduzem tempo de treinamento das brigadas.
Em private label, combine estética de embalagem com robustez de dados. O comprador espera mockups, blueprint de arte com áreas seguras, e checklists de conformidade por país. Paletização otimizada para contêineres de 20 e 40 pés, com indicação de quantidade por pallet e por contêiner, acelera cotações de frete e análise de giro no centro de distribuição do varejista.
Logística e prazos: ar para o fresco, mar para o congelado
A rota define a promessa de venda. Filé fresco depende de transporte aéreo com tempo porta a porta típico de 48 a 72 horas até hubs americanos e europeus. Isso exige planejamento de colheita, processamento e consolidação alinhados aos horários de voo, além de coordenação com a equipe de despacho e a companhia aérea. Termômetros e data loggers dentro das caixas ajudam a comprovar manutenção de temperatura ao longo da jornada. No destino, a liberação aduaneira precisa estar antecipada para evitar atrasos que reduzam a vida útil do produto na gôndola.
Para congelados, o transporte marítimo é o padrão. Contêineres refrigerados com set point entre −18 °C e −20 °C preservam textura e aspectos sensoriais. O tempo de trânsito para costa leste dos EUA gira, em média, entre 12 e 20 dias, dependendo do porto de saída e das escalas. Para a Europa, prazos similares ou ligeiramente superiores, conforme o destino. A preparação documental, com faturas, packing list, certificados sanitários e de origem, deve nascer junto com a ordem de produção. Assim, o armador recebe o booking com antecedência e a operação evita custos extras de armazenagem no porto.
A escolha do Incoterm afeta a precificação final. Em FOB, o comprador assume frete e seguro e o exportador concentra esforços em fábrica e porto de embarque. Em CIF ou CIP, frete e seguro entram na conta do exportador, que passa a negociar cotações com transportadoras e seguradoras. Em DDP, a responsabilidade se estende até a porta do cliente, o que pode fazer sentido em testes com redes novas, mas exige parceiro logístico experiente no país de destino. Seja qual for o termo, descreva as responsabilidades em contrato e inclua tolerância de peso por lote para reduzir disputas comerciais.
As embalagens precisam suportar o trajeto. Caixas isotérmicas, gel packs e gelo em flocos são combinados para o fresco. Para congelados, caixas resistentes ao empilhamento preservam integridade e permitem melhor uso do espaço no contêiner. Selos de inviolabilidade e etiquetas resistentes à umidade facilitam o manuseio em câmaras frias e reduzem perdas por identificação incorreta.
Regulação e habilitação: passo a passo para os dois destinos
A habilitação começa no Brasil. A planta precisa estar registrada e inspecionada, com programas de Boas Práticas de Fabricação e APPCC implementados. Lotes devem ser rastreáveis desde a origem do peixe até o produto final. A documentação sanitária, emitida pela autoridade competente, acompanha as cargas e precisa refletir exatamente o conteúdo de cada remessa. Esse conjunto forma a base para que o importador conclua registros e cumpra exigências no destino, reduzindo riscos de retenção e análise laboratorial por amostragem ampliada.
Nos Estados Unidos, o importador deve atender ao programa de Verificação de Fornecedores Estrangeiros (FSVP). Isso exige que haja uma avaliação do processo do exportador, registros de controle preventivo e histórico de conformidade. O estabelecimento do exportador se registra junto às autoridades competentes e mantém um ponto de contato para eventuais auditorias ou solicitações de informação. Rotulagem em inglês, declaração de país de origem e lista de ingredientes, quando aplicável, são itens conferidos na entrada. Para fresco, a data de produção e a temperatura de manutenção durante o transporte são frequentemente verificadas.
Na Europa, a empresa precisa estar listada para exportação e utilizar o TRACES NT para emissão e validação de certificados. As regras de rotulagem incluem denominação de venda, método de produção, zona de captura ou origem da aquicultura, peso líquido escorrido quando houver cobertura de gelo, e indicações obrigatórias no idioma do país de destino. O importador europeu também cumpre obrigações de controle oficial, o que torna essencial que os documentos cheguem completos e sem divergências de descrição de mercadoria, códigos e pesos.
Testes laboratoriais fazem parte da rotina. O exportador deve manter plano de amostragem para microbiologia, histamina quando pertinente, e parâmetros físico‑químicos relevantes. Em cargas congeladas, análises de temperatura e verificação de glaze são frequentes. A clareza e a organização dos dossiês técnicos encurtam o tempo de liberação, um ganho direto para a competitividade do produto brasileiro.
Valor agregado: cortes, empanados e linhas para cada canal de venda
O estudo indica que há espaço para diversificar o portfólio com itens de maior valor. Cortes como loins, porções calibradas e tiras para empanar ampliam o alcance da tilápia em diferentes ocasiões de consumo. Em varejo, kits prontos com tempero seco separado e instrução de preparo em 10 a 15 minutos atendem quem busca conveniência. Em redes de restaurantes, porções com espessura consistente facilitam o preparo e asseguram ponto ideal com menor variação entre lojas.
Produtos empanados pedem atenção à cobertura e ao rendimento. Uma boa formulação mantém crocância após minutos de viagem no delivery, com menor absorção de óleo e cor estável. O cliente profissional quer especificação completa: peso por peça, rendimento na fritura, tempo e temperatura recomendados, e vida útil. Linhas com molho em sachê separado permitem padronização de sabor em redes de grande porte. Para canais institucionais, bandejas com porções individuais e embalagens de abertura fácil aceleram o serviço e reduzem desperdício.
No atacado, caixas de 5 kg a 10 kg com porções IQF misturam praticidade e custo eficiente. Já no varejo premium, embalagens menores com apelo visual, fotos de preparo e informações claras sobre origem e processamento destacam o produto na gôndola. Em ambos os casos, o desafio é manter padrão entre lotes, com cor e textura repetíveis, para que o consumidor reconheça a qualidade na recompra.
Programas sazonais ajudam a abrir portas. Nos EUA, datas como primavera e fim de ano estimulam varejistas a testar SKUs temporários. Na Europa, feriados regionais e festivais gastronômicos criam vitrines para lançamentos. A recomendação é negociar janelas de teste com métricas de desempenho definidas previamente, como giro, margem e ruptura, e entrar com planejamento de mídia cooperada focado em preparo e praticidade.
Precificação: como montar a conta do preço final ao cliente
A formação de preço para exportação combina fatores previsíveis e variáveis. Entre os previsíveis estão custo de produção por quilo, rendimento de filé, custo de embalagem e despesas fixas da planta. Entre as variáveis aparecem câmbio, frete internacional, seguro, taxas portuárias e eventuais tarifas de importação. O estudo recomenda planilhas por SKU com cenários de câmbio e frete, e contratos que prevejam faixas de ajuste. Quando a margem fica comprimida, a saída pode ser migrar parte do mix para itens com maior valor por quilo, diluindo custos logísticos dentro da caixa.
Nos Estados Unidos, os reajustes de tarifa a partir de agosto de 2025 exigem simulações por porto de destino e por modalidade de transporte. Em cargas aéreas de filé fresco, o frete tem peso elevado na equação, e pequenos ganhos de eficiência na cadeia de frio fazem diferença. Em cargas marítimas de congelados, o volume por contêiner e a ocupação de pallets determinam o custo por quilo posto no destino. A conta precisa considerar também a taxa de ruptura no varejo e a taxa de devolução, que devem ser monitoradas desde o primeiro envio.
Na Europa, o preço final passa por variações de IVA, políticas de preço por país e acordos comerciais com redes regionais. O exportador deve preparar propostas com escalonamento de descontos por volume e contrapartidas de espaço em gôndola e ações de degustação. Em private label, a margem é negociada com base em comparáveis de prateleira e no diferencial de especificação. Em marcas do fornecedor, a força da comunicação de preparo e a consistência sensorial são argumentos diretos para sustentar preço.
Ferramentas simples ajudam a dar previsibilidade. Defina um “preço‑alvo posto destino” por SKU e trabalhe de trás para frente na composição dos custos. Use bandas de câmbio para acionar gatilhos de revisão. Em contratos de longo prazo, inclua cláusulas de reequilíbrio quando índices de frete superarem limites acordados. E mantenha relatórios de margem por cliente, ajustando mix quando necessário.
Qualidade desde a origem: biossegurança, manejo e processamento
A qualidade percebida no destino começa na criação. Lotes uniformes, densidades compatíveis e manejo que reduza estresse impactam diretamente coloração, textura e rendimento do filé. O calendário de colheita deve conversar com o cronograma de processamento, para evitar longas esperas e preservar o frescor. Registros de alimentação, conversão alimentar e idade de abate oferecem previsibilidade de calibres e ajudam a programar pedidos por tamanho de filé e porção.
No abate e filetagem, pontos de verificação em linha mantêm padrão. Controle de temperatura desde o primeiro resfriamento, higienização rigorosa de superfícies, verificação de contaminação e inspeções visuais de trim garantem um produto final consistente. Programas de BPF e APPCC, com registros fotográficos e checklist por turno, formam a base do dossiê técnico que acompanha negociações com importadores. Indicadores como contagem padrão em placas, presença de patógenos alvo e resultados de shelf life são monitorados em séries históricas para dar segurança ao comprador de longo prazo.
A padronização do corte é outro diferencial. Em filés frescos, espessura homogênea e remoção cuidadosa de espinhas aumentam aceitação. Em porções congeladas, serras e guias calibradas reduzem variações e elevam rendimento na produção e na cozinha do cliente. As equipes de QA precisam de treinamentos periódicos, com amostras de referência e painéis sensoriais internos para detectar desvios de cor, odor e textura antes do despacho.
Rastreabilidade efetiva conecta cada caixa ao lote de origem. Sistemas simples, com códigos de barras e planilhas bem mantidas, já permitem responder a auditorias. Em operações maiores, ERPs com módulos de chão de fábrica integram ordens de produção, controle de estoque e documentação de exportação. O importante é que a informação esteja disponível e seja confiável quando solicitada por clientes e autoridades.
Vendas e relacionamento: como abrir e manter clientes no exterior
O primeiro envio quase sempre nasce de uma amostra bem planejada. Amostras devem replicar a especificação real de venda, com rótulo, lote e ficha técnica idênticos aos do produto comercial. O importador precisa testar preparo, rendimento e aceitação interna. Ao mesmo tempo, o exportador coleta feedback e ajusta detalhes antes de ofertar um lote piloto. Esse ciclo rápido encurta o caminho até a primeira PO e evita retrabalho.
Negociações funcionam melhor com informação estruturada. Leve lista de preços por SKU, condição de pagamento e prazos de produção. Apresente capacidade mensal por tamanho de filé, janelas de colheita e flexibilidade para picos sazonais. Mostre histórico de conformidade, resultados de auditorias e plano de contingência para atrasos de voo ou navio. Redes de food service valorizam visitas técnicas às plantas; varejistas pedem relatórios fotográficos de processos e depósito.
Depois da venda, a régua de relacionamento mantém o cliente. Relatórios de OTIF (on time, in full), taxa de reclamação e giro por SKU dão transparência. Em problemas, resolva rápido: crédito comercial, reposição ou ajuste de preço evitam erosão de confiança. Programas de revisão trimestral ajudam a recalibrar preços, mix e previsões. O objetivo é simples: tornar o fornecedor brasileiro uma peça estável no abastecimento do comprador, reduzindo a tentação de trocar de origem por centavos em momentos de pressão de margem.
Feiras e missões comerciais seguem úteis para prospecção, mas a conversão vem do acompanhamento próximo após o primeiro contato. Apresente planos de lançamento por praça, com ações de degustação em loja e materiais de PDV. Em food service, ofereça treinamento de preparo, fichas técnicas e vídeos curtos que simplifiquem a execução no restaurante. Esse pacote reduz atritos e acelera o giro, criando base para pedidos maiores.
Roteiro prático: 90 dias para os EUA e 120 dias para a Europa
Um cronograma realista ajuda a tirar o projeto do papel. Para os Estados Unidos, o caminho típico leva 90 dias do primeiro contato até a primeira carga. Nos primeiros 15 dias, organize dossiê técnico, catálogos, tabela de preços e selecione SKUs. Entre os dias 16 e 30, envie amostras e alinhe especificações. Dos dias 31 a 45, negocie condições comerciais, Incoterm e janela de produção. Entre 46 e 60, conclua cadastros, alinhamentos regulatórios e bookings. Dos dias 61 a 90, produza, embarque e acompanhe a liberação. Ajustes finos acontecem logo após a chegada, com base no feedback do cliente e no desempenho em gôndola ou cozinha.
Na Europa, o ciclo tende a ser um pouco mais longo, cerca de 120 dias. Os 30 primeiros dias focam em documentação e listagem no sistema oficial. Em paralelo, avance com amostras e testes de mercado em redes regionais. Entre os dias 31 e 60, feche o mix de SKUs e defina plano de comunicação em loja ou cardápio. Dos dias 61 a 90, conclua registros, rótulos no idioma local e bookings. Entre 91 e 120, rode a produção, embarque e execute ativações de lançamento. O segredo é tratar o primeiro lote como projeto: mensure giro, colete dados e ajuste gramaturas e embalagens rapidamente.
Do lado interno, alinhe criação, fábrica e comercial. Um comitê quinzenal com metas, gargalos e indicadores acelera decisões. Use um quadro de controle simples, com status por cliente, por SKU e por etapa de exportação. Ferramentas acessíveis, como planilhas compartilhadas e checklists digitais, já resolvem o essencial quando bem mantidas e atualizadas.
Para o fluxo de caixa, planeje capital de giro. Produção para exportação imobiliza insumos, embalagens e horas de processamento antes da venda. Negocie adiantamentos com clientes estratégicos em pedidos piloto e avalie linhas de financiamento específicas para exportação. Quanto mais previsível for o calendário de produção e embarque, menor o custo financeiro por quilo.
Erros comuns e como evitar no processo de exportação
Alguns tropeços aparecem com frequência e podem ser corrigidos cedo. O mais comum é prometer prazos sem validar capacidade de colheita e processamento, o que leva a reprogramações e perda de credibilidade. Outro é enviar amostras que não representam o produto final, gerando frustração no primeiro pedido. Há ainda falhas de documentação, como divergência entre peso declarado e conferido, ou rótulos sem itens obrigatórios no idioma do destino. Tudo isso se evita com checklists e revisões entre áreas antes do embarque.
No produto, variações de tamanho acima do combinado atrapalham o porcionamento em rede de restaurantes e o posicionamento de preço em gôndola. Em congelados, glaze fora do padrão reduz confiança e pode gerar créditos ao cliente. Em fresco, atrasos na liberação aduaneira encurtam a vida de prateleira. Para reduzir riscos, alinhe janelas de voo, reforce a preparação documental e use data loggers para registrar temperatura. Em caso de imprevisto, responda com plano de contingência: redirecionamento da carga para um cliente alternativo, crédito imediato ou reposição.
- Defina especificações por escrito e troque amostras de referência.
- Use checklists para documentos, rótulos e paletização.
- Monitore temperatura com dispositivos simples em caixas‑piloto.
- Faça pós‑venda estruturado em até 7 dias após a chegada.
- Revise mix e preços a cada trimestre ou diante de mudanças de frete e tarifas.
Canais e formatos: varejo, food service e marcas próprias
Cada canal compra de um jeito. No varejo, decisões passam por curadoria de categoria, comparação com concorrentes diretos e performance por metro linear. As lojas pedem materiais de ponto de venda, fotos de preparo e instruções claras para o consumidor. Em redes com operação de peixaria, cortes frescos ganham destaque visual e pedem reposição frequente. Em lojas que priorizam congelados, a briga é por espaço em freezers e profundidade de estoque bem calculada para evitar ruptura.
No food service, a linguagem é de cozinha. O comprador quer rendimento, tempo de preparo e consistência. Porções padronizadas e embalagens que facilitem mise en place fazem diferença. Treinamentos simples, com vídeos curtos e fichas técnicas, aceleram a adoção em novas redes. Em marcas próprias, o varejista dita embalagem, arte e preço alvo. O fornecedor precisa entregar qualidade e confiabilidade de abastecimento, além de flexibilidade para ajustes de última hora em campanhas sazonais.
Para ganhar escala, é útil começar com regiões e clientes piloto. Na costa leste dos EUA, redes regionais permitem ajustes rápidos de sortimento. Na Europa, mercados como Portugal, Espanha e Reino Unido oferecem portas de entrada com perfis de consumo distintos. Testes controlados, com mensuração semanal de giro, apontam rapidamente os SKUs mais promissores e evidenciam onde é preciso mexer em gramaturas, cortes e mensagens na embalagem.
A comunicação deve enfatizar preparo descomplicado. Receitas de 15 minutos, sem espinhas aparentes e com sugestões de acompanhamentos locais, conectam o produto à rotina do consumidor. Para públicos que já compram peixes brancos, o argumento é substituição direta em pratos conhecidos. Para quem ainda não experimentou, a proposta é sabor suave e textura firme, com orientação clara de preparo na frigideira, no forno ou na air fryer.
Indicadores que importam: do giro ao OTIF, do claim ao recall
Medir é parte do jogo. Acompanhe giro por SKU, margem por cliente, ruptura por loja e devoluções por motivo. Em logística, OTIF mostra se a operação entrega no prazo e na quantidade combinada. Em qualidade, taxas de reclamação por lote e resultados de auditoria contam a história que o número de vendas isolado não mostra. Com esses dados, fica mais simples decidir quando ampliar o sortimento, trocar embalagens ou ajustar preços.
A rastreabilidade fecha o ciclo. Em caso de recall, o fornecedor deve identificar rapidamente os lotes afetados, informar compradores e executar o plano de retirada. A resposta ágil preserva relações e reduz impactos comerciais. Relatórios pós‑incidente alimentam melhorias no processo e previnem repetição do problema. Para a tilápia brasileira, que busca escala em mercados exigentes, essa disciplina operacional é um ativo competitivo.
Perguntas frequentes: dúvidas que surgem na hora de exportar
Qual o melhor primeiro produto para os EUA? A recomendação mais comum é começar com porções congeladas e um SKU de filé fresco em mercado piloto. As porções oferecem previsibilidade de custo, e o filé fresco abre portas em restaurantes que valorizam textura e coloração. Com os primeiros resultados, amplia‑se a linha com cortes específicos para cada canal.
E para a Europa? Iniciar com fresco em hubs com oferta aérea e redes parceiras acelera a construção de marca e hábito de consumo. Em paralelo, trabalhar congelados IQF em mercados que já compram peixes brancos no freezer. A comunicação deve ser direta, com preparo simples e informação objetiva de rendimento e porção por pessoa.
Como lidar com o impacto das tarifas nos EUA a partir de agosto de 2025? A saída é somar eficiência operacional com inteligência comercial. Negocie contratos de médio prazo, revise Incoterms, otimize mix para itens de maior valor por quilo e busque previsibilidade de frete. O objetivo é manter presença no cliente, protegendo margem e participação de gôndola ou menu.
Quais documentos nunca podem faltar? Fatura comercial, packing list, certificado sanitário, certificados de origem quando aplicáveis e rótulos no idioma do destino. Para os EUA, atenção a registros do importador e aos requisitos de verificação de fornecedor. Para a Europa, trabalhe com o TRACES NT e confirme exigências locais de rotulagem antes de imprimir embalagens em grande volume.
Próximos passos para o setor: foco, consistência e escala
O avanço da tilápia brasileira nos Estados Unidos e na Europa depende de decisões práticas no dia a dia. Escolher SKUs que entreguem rendimento e margem, organizar calendário de produção e logística, e manter dossiês técnicos atualizados são tarefas que consolidam a presença nesses mercados. A vantagem competitiva do Brasil combina disponibilidade de matéria‑prima, conhecimento industrial e capacidade de resposta rápida a pedidos de clientes profissionais e redes de varejo.
Com consumo alto nos EUA e espaço de crescimento na Europa, o momento favorece quem entra com planejamento e disciplina. O estudo da Embrapa oferece as linhas mestras. Cabe às empresas transformar essas diretrizes em rotina, com métricas, prazos e responsabilidade clara por etapa. Quando o produto chega padronizado, a entrega acontece no prazo e o comprador encontra suporte técnico, a recompra vira regra e a participação do Brasil cresce de forma sustentada nos dois destinos.