Safra 25/26: 354 mi t no radar — a supercolheita histórica que pode mexer nos preços e turbinar exportações

Safra 25/26: 354 mi t no radar — a supercolheita histórica que pode mexer nos preços e turbinar exportações

A safra de grãos 2025/26 começa com estimativa de 353,8 milhões de toneladas, número arredondado para 354 milhões e suficiente para projetar o maior ciclo da história se o ritmo for mantido. O dado foi divulgado pela Conab em 18 de setembro de 2025 e compara com o volume final de 350,2 milhões de toneladas da temporada 2024/25. O avanço vem sobretudo da ampliação da área plantada, enquanto a produtividade média tende a ceder em 2% diante do calendário mais apertado, dos custos financeiros elevados e da necessidade de reorganizar o plantio região a região.

O cenário macroeconômico ajuda a explicar a cautela. O Banco Central projetou, no Boletim Focus fechado em 29 de setembro de 2025, inflação oficial menor neste e no próximo ano e câmbio mais baixo que meses atrás. O Copom, porém, manteve a Selic em 15% ao ano, o que ainda encarece o crédito, limita a troca de máquinas e restringe a capacidade de financiar insumos. Ao mesmo tempo, a queda dos juros nos Estados Unidos fortaleceu o real em alguns pregões, pressionando a competitividade de exportadores. Em outubro, produtores entram na janela de decisões: travar preços, ordenar o plantio e evitar gargalos logísticos serão movimentos decisivos para transformar as projeções em colheita efetiva.

Panorama econômico: juros, câmbio e o impacto direto no campo

O Focus de 29 de setembro trouxe projeção do IPCA em 4,81% para 2025 e 4,28% para 2026, ambas em queda na margem. Para o PIB, o mercado estima expansão de 2,16% em 2025 e 1,8% em 2026, com pequena retração das expectativas anteriores. O câmbio previsto no encerramento de 2025 ficou em R$ 5,48 e em R$ 5,58 para 2026. No campo dos juros, a sinalização foi mista: a Selic se manteve em 15% ao ano para 2025 e recuou para 12,25% em 2026, aliviando o horizonte mais longo, mas ainda impondo custo alto ao capital de giro nesta virada de safra. Para quem precisa formar lavoura, o recado é claro: planejamento financeiro e disciplina no fluxo de caixa são tão importantes quanto calendário agronômico.

No ambiente externo, a primeira redução de juros pelo Federal Reserve em nove meses aumentou a volatilidade cambial. Em tese, cortes lá fora tendem a favorecer moedas emergentes; na prática, cada decisão do Copom redefine a leitura de risco Brasil. Para o agro, um real mais forte reduz a receita em reais por saca exportada e altera o cálculo de hedge. Por outro lado, a moeda mais valorizada baixa o custo de fertilizantes, defensivos e máquinas importadas. A estratégia mais citada por consultores é combinar uma parte de proteção de preços nas bolsas (B3 ou Chicago) com compras escalonadas de insumos, evitando concentrar decisões em uma única janela de câmbio.

FAO: preços internacionais de alimentos em setembro e o reflexo nas cotações internas

O Índice de Preços de Alimentos da FAO fechou setembro em 131,4 pontos, 1% acima de agosto e 7,8% acima de setembro de 2024. Entre os grupos, cereais recuaram 0,6%, pressionados pelo trigo, que enfrenta oferta global ampla e demanda moderada. O milho mostrou firmeza, sustentado por incertezas quanto à produtividade na União Europeia e pela demanda aquecida de etanol nos Estados Unidos. Laticínios caíram 0,9% com quedas em manteiga, queijo e leite em pó integral, reflexo de oferta global confortável. O equilíbrio entre grãos básicos e energia renovável fora do Brasil mantém a curva do milho sensível ao noticiário sobre estoques e ritmo de esmagamento para etanol norte-americano.

Nos óleos vegetais, a alta de 2,9% levou o subíndice ao maior patamar em dois anos, puxado pelo óleo de palma, diante de demanda firme para biocombustíveis e menor produção no Sudeste Asiático. O óleo de soja oscilou levemente, apoiado nas boas expectativas para a safra 2025/26 na América do Sul. Nas carnes, o avanço de 1,1% marcou novo recorde, com destaque para a bovina, sustentada por compras da China e dos Estados Unidos. Carnes de frango passaram por leve recomposição após meses de queda, beneficiadas por exportações brasileiras maiores e redução gradual de restrições sanitárias em alguns mercados. Açúcar registrou estabilidade técnica, com variação de 0,1% no mês, reforçando um quadro de preços laterais em meio à maior oferta global.

Conab: primeira leitura da 25/26 e o balanço final da 24/25

O primeiro levantamento da Conab para 2025/26, publicado em 18 de setembro, projeta 353,8 milhões de toneladas. A área plantada subiria 3,1%, alcançando 84,2 milhões de hectares, cerca de 2,5 milhões de hectares a mais que no ciclo anterior. A produtividade média é estimada em 4.199 kg/ha, queda de 2% em relação a 2024/25. Na divisão por cultura, a soja tende a crescer 3,6%, o algodão 0,7% e o milho recuar 1,0%. A fotografia inicial indica expansão puxada por regiões com melhor janela climática e reorganização de rotação de culturas, porém sob a sombra do crédito caro e da necessidade de uma logística mais afinada para escoar volumes potencialmente recordes.

A Conab também encerrou a temporada 2024/25 com elevação: de 345,2 milhões de toneladas em agosto para 350,2 milhões em setembro. Na comparação com 2023/24, a produção cresceu 16,3%, a área 2,3% e a produtividade 13,7%, renovando os recordes históricos. O resultado consolidado melhora o ponto de partida para 2025/26, mas impõe desafios: armazenagem ajustada em estados líderes, competição por caminhões nas janelas de colheita e necessidade de sincronizar contratos de venda com capacidade de embarque portuário. Em um ano de câmbio mais volátil, a gestão comercial terá peso semelhante ao manejo dentro da porteira.

Milho: oferta global, andamento da colheita nos EUA e o quadro no Brasil

O USDA revisou para 1,287 bilhão de toneladas a projeção global de milho em 2025/26, 4,7% acima de 2024/25. Por país, Estados Unidos devem colher 427,1 milhões de toneladas, China 295 milhões, Brasil 131 milhões, União Europeia 55,3 milhões e Argentina 53 milhões. Estoques finais foram estimados em 281,4 milhões de toneladas, queda de 1,0% em relação ao mês anterior. Na semana encerrada em 21 de setembro, os EUA reportaram 11% da área colhida, em linha com a média dos últimos cinco anos, com 49% das lavouras em condição boa e 17% excelente. O avanço da colheita tende a trazer maior clareza sobre qualidade de grão e peso específico, variáveis que influenciam prêmio nos embarques.

No Brasil, a 2024/25 foi a mais produtiva da série histórica da Conab: 139,7 milhões de toneladas, com 24,9 milhões na primeira safra, 112 milhões na segunda e 2,7 milhões na terceira. A produtividade média ficou em 6.391 kg/ha, alta de 16,5%, num total de 21,9 milhões de hectares, 3,8% acima da safra anterior. Até 20 de setembro, 99,6% da área de milho 2ª safra estava colhida, e o plantio da 1ª safra 2025/26 somava 20,8%, com Rio Grande do Sul, Paraná e Santa Catarina em 50%, 48% e 40%, respectivamente. Em Chicago, em 26 de setembro, dezembro/2025 fechou a US$ 4,219 por bushel, quase estável no mês. O produtor brasileiro, diante de prêmio mais apertado e câmbio em baixa no fim de setembro, encontra estímulo adicional para alongar decisões de venda e repartir lotes entre mercado interno e exportação.

Soja: ajustes do USDA, condições nas lavouras e o arranque do plantio no Brasil

A estimativa global de soja para 2025/26 foi ajustada para 425,9 milhões de toneladas, 0,4% acima de 2024/25. Entre os três maiores produtores, apenas o Brasil deve crescer ante a safra anterior, para 175 milhões de toneladas, alta de 3,5%. Os Estados Unidos foram projetados em 117 milhões de toneladas, queda de 1,5%, e a Argentina permaneceu em 48,5 milhões, recuo de 4,7%. Os estoques finais passaram a 18,2 milhões de toneladas, 1,7% acima do ciclo passado. Nos EUA, até 21 de setembro, 9% da área estava colhida, com 48% das lavouras em condição boa e 13% excelente, espelhando um quadro um pouco melhor que o de 2024 na mesma data.

No Brasil, a 2024/25 fechou com 171,5 milhões de toneladas, alta de 13,3% em relação ao ciclo anterior. A produtividade média chegou a 3.621 kg/ha, avanço de 10,3%, em 47,3 milhões de hectares, aumento de 2,7%. O plantio da 2025/26 começou de forma lenta: 0,6% até 20 de setembro, contra 1,0% na média de cinco anos, com Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Paraná iniciando as operações. Em Chicago, o contrato novembro/2025 foi cotado a US$ 10,12 por bushel em 26 de setembro, leve baixa mensal. Na prática, o produtor observa a umidade do solo, calibra janela de semeadura e monitora prêmios nos portos, enquanto traders avaliam as sinalizações do crush norte-americano e a demanda da Ásia por farelo e óleo.

Algodão: avanço de produção no Brasil e sinal amarelo no balanço global

O USDA elevou a projeção de pluma global 2025/26 para 25,6 milhões de toneladas, ainda 1,5% menor que 2024/25. A China deve ofertar 7,1 milhões de toneladas, a Índia 5,2 milhões e o Brasil 4,0 milhões, alta de 8,1% frente à temporada anterior. Os Estados Unidos mantiveram 2,9 milhões, 8,3% abaixo do ciclo passado. Estoques finais foram estimados em 15,9 milhões de toneladas, 1,2% inferiores aos 16,1 milhões de 2024/25. Até 21 de setembro, 37% das lavouras norte-americanas estavam avaliadas como boas e 10% excelentes, um nível confortável, apesar da oscilação semanal.

No Brasil, a 2024/25 encerrou com 4,1 milhões de toneladas de pluma, 9,7% acima de 2023/24, produtividade de 1.947 kg/ha e área de 2,1 milhões de hectares, alta de 7,3%. O país consolida posição entre os três maiores fornecedores mundiais e amplia a presença em mercados que exigem regularidade de entrega e padrão de fibra. A colheita alcançava 99% em 20 de setembro, e o plantio da 2025/26 começa em novembro. Em Nova York, dezembro/2025 encerrou em 66,37 centavos de dólar por libra-peso em 26 de setembro, praticamente estável no mês. Para tradings e usinas, a chave está em casar contratos externos com o ritmo de beneficiamento, preservando margens em um ambiente de custos financeiros ainda elevados.

Culturas de inverno: trigo perde área; aveia, canola e cevada avançam

A Conab estimou 9,6 milhões de toneladas para a safra de inverno. No trigo, a produção recuou para 7,54 milhões de toneladas, queda de 4,5%, em linha com a redução de área mesmo com algum ganho de produtividade. Aveia, canola e cevada cresceram em área plantada, com variações de 7,9%, 43,2% e 8,4%, respectivamente. A soma dos fatores aponta para um inverno mais diversificado e com melhor distribuição de risco entre culturas, sobretudo em estados que vinham concentrando investimento em trigo e agora ajustam o portfólio para preservar renda e liquidez.

A área destinada ao inverno caiu 13,1% frente a 2023/24, puxada por retrações em centeio (-26,9%), trigo (-19,9%) e triticale (-21,8%). A leitura para a próxima safra dependerá da janela de semeadura no verão e da reação dos preços na entressafra, especialmente para trigo panificável nos polos industriais do Sudeste e Nordeste. A dinâmica de importação continuará relevante nas contas das moageiras, que observam paridade com Argentina e outros fornecedores, além de custos logísticos internos e disponibilidade de frete rodoviário no pico das colheitas de soja e milho.

Exportações do agro em agosto: volume maior compensa preço menor

As vendas externas do agro somaram US$ 14,3 bilhões em agosto de 2025, alta de 1,5% sobre agosto de 2024. O desempenho decorreu do aumento de 5,1% no volume embarcado, que compensou a queda de 3,4% nos preços médios. O setor respondeu por 48% das exportações totais do país no mês. As importações de produtos agropecuários ficaram em US$ 1,6 bilhão, leve alta de 1,2%. Cinco cadeias responderam por 80,8% das vendas: complexo soja, carnes, sucroalcooleiro, cereais/farinhas/preparações e produtos florestais. O mix mostra como a recomposição da safra brasileira sustentou a pauta mesmo com preços internacionais menos aquecidos em alguns segmentos.

A soja em grão voltou a liderar, com 9,3 milhões de toneladas (+16,2%), gerando US$ 3,9 bilhões (+11,0%) apesar do recuo de 4,4% no preço médio. Ao longo de 2025, o total exportado supera 66 milhões de toneladas, cerca de três quartos da safra. A carne bovina in natura foi o segundo destaque: US$ 1,5 bilhão (+56%) e 268,6 mil toneladas (+23,5%), recordes para meses de agosto, com preços médios 26,3% maiores e forte demanda da China, além de México, Rússia e União Europeia. O milho avançou para US$ 1,4 bilhão (+17,1%) e 6,8 milhões de toneladas (+12,9%), com a União Europeia na liderança do crescimento (+297,4%). Itens como sebo bovino, sementes oleaginosas, feijões secos e rações para pets registraram os melhores resultados da série histórica, reforçando uma pauta mais diversificada.

Itens em queda e leitura para o curto prazo do comércio exterior

Alguns produtos relevantes perderam tração em agosto. O açúcar bruto somou US$ 1,31 bilhão (-16,5%), afetado por maior oferta global e redução de compras em destinos como Emirados Árabes e Malásia. O farelo de soja recuou para US$ 643,6 milhões (-24,1%), com queda de volume e preço. A carne de frango in natura faturou US$ 630,5 milhões (-15,7%), ainda sob efeitos de restrições temporárias após registro de influenza aviária. Esses movimentos tendem a influenciar as decisões de embarque no quarto trimestre e a composição dos contratos para o início de 2026, com atenção para mercados que alternam entre compras spot e volumes sob acordos de longo prazo.

Para tradings e cooperativas, a mensagem é calibrar a gestão de prêmios e a escolha de destinos. Quando o câmbio recua, o prêmio precisa trabalhar mais para preservar a receita em reais; quando a taxa de câmbio sobe, prêmios podem afrouxar sem ferir margem. A sobreposição de picos logísticos — escoamento de milho da 2ª safra, início dos embarques de soja precoce, açúcar e celulose — exige planejamento de navios, filas em terminais e capacidade ferroviária. Em agosto, a taxa de câmbio tocou R$ 5,28 em alguns momentos, reduzindo a atratividade de vender volumes grandes sem proteção. Em outubro, o monitoramento simultâneo de Chicago, prêmios e dólar tende a definir quem capturará as melhores janelas.

VBP em alta: receita bruta da agropecuária cresce dois dígitos em 2025

O Valor Bruto da Produção Agropecuária, calculado pelo Ministério da Agricultura, chegou a R$ 1,406 trilhão em agosto de 2025, 11,3% acima do ano anterior. As lavouras contribuíram com R$ 928,1 bilhões (+10,8%) e a pecuária com R$ 478,1 bilhões (+12,3%). Entre os maiores avanços aparecem café (+47,2%) e amendoim (+43,0%). Nas retrações, batata-inglesa (-53,9%) e laranja (-17,9%). O indicador consolida o efeito de uma safra volumosa combinada a preços ainda remuneradores em parte das cadeias, com ganhos de produtividade em polos tradicionais e expansão de fronteira agrícola em regiões do Centro-Oeste e do Matopiba.

O VBP em alta traz um elemento de respiro para o fluxo de caixa no campo e para a arrecadação em municípios onde o agronegócio é a principal base econômica. Ainda assim, a fotografia do caixa não elimina o desafio do custo do dinheiro: manter tecnologia e renovar frota com Selic de dois dígitos exige maior previsibilidade de receita. Daí a importância de combinar instrumentos de proteção de preço com crédito de longo prazo, buscando reduzir a exposição a oscilações de curto prazo. Para agroindústrias, a expectativa é de melhor utilização de capacidade e negociadores mais ativos no travamento de margens para 2026.

Cítricos: Fundecitrus reduz safra 2025/26 e aponta avanço do greening

A primeira reestimativa do Fundecitrus para a safra 2025/26 em São Paulo e Minas Gerais projetou 306,7 milhões de caixas, 2,5% abaixo do cálculo de maio. O principal motivo foi o avanço do greening, que atinge 47,6% do cinturão citrícola, ante 44,3% em 2024, elevando a queda de frutos e pressionando a produtividade. A colheita avança mais lenta, afetada também pelo atraso na maturação e por condições climáticas que alongaram a janela de manejo. A indústria acompanha de perto a qualidade do fruto e o teor de sólidos, fatores que definem contratos e bonificações na entrega.

Para produtores, a reorganização de talhões e a intensidade de tratos culturais tornaram-se decisivas para preservar produtividade por planta e por hectare. Vendedores de insumos registram maior busca por soluções de monitoramento e técnicas de manejo de pragas. No curto prazo, o mercado acompanha como a oferta ajustada impactará as cotações de laranja destinada à indústria e se haverá reflexos no cronograma de processamento. Ao longo do ciclo, a eficiência operacional dos pomares fará diferença entre cumprir ou não as metas previstas em contratos com indústrias de suco.

Preços internos: referência ao fim de setembro e sinais para outubro

No fechamento de 26 de setembro de 2025, o milho físico em cooperativa de São Paulo foi negociado a R$ 61,00 por saca, enquanto o contrato julho/2026 na B3 encerrou em R$ 69,26. Na soja, o preço spot ficou em R$ 129,00 por saca (FOB) e a entrega em março de 2026 em R$ 120,50 por saca (FOB). O algodão, pela base Esalq, ficou em R$ 121,16 por libra-peso. O trigo foi cotado a R$ 1.150,00 por tonelada (FOB). Entre outras referências do Cepea: café arábica a R$ 2.124,03 por saca, laranja para indústria a R$ 50 por caixa de 40,8 kg (a prazo) e boi gordo a R$ 302,95 por arroba. As séries mostram um mercado que testa novas faixas de preço ao mesmo tempo em que o câmbio perde força temporariamente.

Com a chegada de outubro, a leitura comum nos balcões é de cautela na venda de grandes volumes sem alguma forma de proteção. Em milho, o avanço da colheita norte-americana tende a adicionar oferta ao mercado global, mas a demanda por etanol nos EUA confere sustentação às cotações. Em soja, traders observam diferenciais nos portos e custos logísticos antes de fechar lotes maiores. No boi, frigoríficos testam escalas e prêmios regionais, enquanto no café a temporada de contratos de exportação avança com atenção a qualidade e peneira. A decisão de travar preço depende, cada vez mais, de conjugar prêmios, câmbio e necessidade de caixa da fazenda.

Cinco pontos do agro para acompanhar em outubro

A nova temporada começa com foco no cumprimento da projeção de 353,8 milhões de toneladas. A expansão de área precisa encontrar aderência prática nas fazendas, em um momento em que muitos produtores revisam a intensidade do plantio de soja e milho por conta do endividamento e do custo do dinheiro. A produtividade média tem viés de queda de 2%, o que exige precisão na janela de semeadura e na regulagem de plantadeiras para limitar perdas. Paralelamente, o balanço global de milho segue ajustado, com os EUA abrindo espaço para influência do etanol nos preços internos deles, fator que costuma repercutir nos contratos de Chicago.

O clima segue como variável determinante do calendário. A possibilidade de La Niña a partir de novembro pode antecipar e alongar janelas de semeadura em áreas do Centro-Oeste e do Matopiba, ao mesmo tempo em que parte do Sul pode enfrentar períodos mais secos, alterando ritmo de plantio e custos. No front internacional, o pacote tarifário dos Estados Unidos sobre uma cesta ampla de itens agropecuários e alimentos processados adiciona incerteza às cadeias, com potencial de reordenar fluxos de comércio e criar espaço para o Brasil em mercados hoje atendidos por produtores norte-americanos. Por fim, o câmbio encerrou a coluna base de referência em R$ 5,28, e as janelas de hedge parecem cada vez mais curtas, exigindo velocidade na tomada de decisão.

  • Aderência do plantio à projeção da Conab e disciplina na gestão de custos, com produtividade média prevista 2% menor.
  • Monitoramento do clima em outubro e início de novembro, com possível La Niña influenciando janelas no Centro-Oeste e no Matopiba e maior atenção no Sul.
  • EUA acelerando a colheita de milho e soja; milho global em 1,287 bilhão de t e soja em 425,9 milhões de t, com dezembro/2025 do milho em torno de US$ 4,24/bushel em 26 de setembro.
  • Efeitos do pacote tarifário dos EUA sobre custos e competitividade, com possíveis redirecionamentos de fluxos e oportunidades pontuais ao Brasil.
  • Câmbio mais baixo no fim de setembro, tocando R$ 5,28, abrindo janelas curtas de travamento de preço para insumos e parte da safra.

Como transformar projeção em colheita: decisões práticas para a 25/26

A travessia entre projeção e realidade se dá na soma de decisões diárias. No plantio, é recomendável definir talhões prioritários por histórico de emergência, umidade e fertilidade, equilibrando as primeiras áreas entre cultivares de ciclo diferente para reduzir risco de concentração na colheita. No financeiro, o primeiro passo é calcular o custo total por hectare com base em preços já travados de fertilizantes, defensivos, semente, diesel e frete, adicionando um colchão para imprevistos. Em seguida, convém mapear quais parcelas de produção poderão ser travadas sem comprometer a liquidez, combinando instrumentos como barter, venda a termo, opções e futuros. Em regiões com volatilidade maior de prêmio de exportação, dividir a comercialização em mais lotes costuma reduzir o risco de preço médio indesejado.

Na logística, o ajuste entre capacidade de armazenagem, colheita e despacho é central em anos grandes. Onde a fazenda não possui armazém, a negociação antecipada de espaço com cooperativas e cerealistas poupa filas e taxas mais altas no pico. Na frente comercial, a recomendação é checar bases de cálculo de cada contrato — ponto de entrega, base FOB/FOB porto, tolerância de qualidade e prazos — e alinhar com a disponibilidade real de caminhões. Em operações com mais de uma cultura, como soja e milho em sucessão, a ideia é planejar o despacho do volume de maior risco de qualidade primeiro, preservando grão mais estável para uma janela posterior com prêmios melhores.

Milho, soja e algodão: onde estão as oportunidades de margem

No milho, a combinação de estoque global ajustado e demanda de etanol nos EUA mantém um piso psicológico em Chicago, ainda que o avanço da colheita pressione cotações em alguns dias. O produtor brasileiro pode capturar margens ao aproveitar momentos de prêmio mais forte em portos do Arco Norte e do Sudeste, casando operações de barter com proteção parcial via opções. Em estados com alto uso de milho na ração animal, a venda regional pode render melhor preço líquido que a exportação, dependendo do frete. Vale reavaliar, fazenda a fazenda, o ponto de indiferença entre mercado interno e externo, atualizando planilhas com fretes reais, descontos de qualidade e prazos de pagamento.

Na soja, a agenda é ditada pela velocidade do plantio e pela expectativa de prêmio na virada do ano. Se o plantio for mais concentrado no Centro-Oeste, a colheita também se concentrará, o que tende a reduzir prêmios no pico dos embarques. Uma alternativa é travar parte do volume com vencimentos distribuídos e manter parcelas para janelas de prêmios melhores, caso a safra sul-americana distribua melhor a colheita entre regiões. No algodão, a valorização do real pressiona a conversão da pluma exportada em reais, exigindo proteção cambial quando viável. Contratos com margens predefinidas em Nova York demandam disciplina na rolagem e no ajuste de basis, mantendo o foco em qualidade para evitar descontos no beneficiamento e na classificação da fibra.

Gestão de risco: calendário, seguro e capital de giro

O cronograma de semeadura deve considerar o escalonamento por ciclos e o risco de alongamento da janela de colheita, que aumenta perdas de campo e custo com máquinas. Onde houver possibilidade de La Niña a partir de novembro, o avanço da semeadura em áreas com melhor retenção de umidade ganha relevância. O seguro rural, quando disponível e aderente ao perfil da fazenda, funciona como amortecedor de caixa e permite decisões comerciais menos pressionadas. É importante, porém, checar franquias, limites e prazos de sinistro. No capital de giro, priorizar linhas com indexadores previsíveis e alongamento compatível com o ciclo produtivo reduz a necessidade de rolagens caras em períodos de baixa de preço.

Para quem opera com cooperativas, vale explorar programas de antecipação de recebíveis e compras coletivas de insumos, que diluem custos e melhoram o poder de barganha. Em mercados voláteis, o uso de opções como proteção parcial pode ser mais adequado que travas totais em futuros, pois mantém alguma participação em altas. A chave é a disciplina: definir por escrito um plano de comercialização por cultura, com percentuais por janela e gatilhos de preço, reduz a influência de ruído diário. Em safras grandes, a atenção ao giro de estoque e ao custo de armazenagem evita erosão silenciosa da margem.

Quem assina a análise e a curadoria dos dados

O conteúdo e as leituras de mercado aqui reunidos seguem a análise de Marcos Fava Neves, professor titular (em tempo parcial) da Faculdade de Administração da USP em Ribeirão Preto (SP) e da Harven Agribusiness School. Sócio da Markestrat Group, é especialista em planejamento estratégico do agronegócio, com atuação em projetos de cadeia de suprimentos, comercialização e políticas públicas setoriais. A trajetória acadêmica e empresarial se reflete na seleção de indicadores, na comparação de ciclos e na recomendação de práticas que equilibram risco e retorno ao longo do ano-safra.

Também contribuem as leituras de Vinícius Cambaúva, associado na Markestrat e professor na Harven, engenheiro agrônomo pela FCAV/UNESP, mestre e doutorando em Administração pela FEA-RP/USP; de Beatriz Papa Casagrande, associada na Markestrat, engenheira agrônoma pela ESALQ/USP e mestra em Administração pela FEA-RP/USP; e de Rafael Barros Rosalino, consultor na Markestrat e médico veterinário pela FCAV/UNESP. O conjunto de fontes e cruzamentos de dados garante visão nacional e internacional das principais cadeias, com foco na tomada de decisão do produtor, das cooperativas e das agroindústrias.



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