A revolução silenciosa da tilápia: bioflocos que poupam água e baixam custos com produção sustentável

A revolução silenciosa da tilápia: bioflocos que poupam água e baixam custos com produção sustentável

O sistema de bioflocos (BFT) ganhou espaço na piscicultura brasileira ao permitir cultivo intensivo de tilápia com baixo consumo de água e alta eficiência no uso da ração. Ensaios conduzidos por equipes da Embrapa em parceria com a Itaipu Binacional, em Foz do Iguaçu (PR), mostraram números consistentes: 135 litros de água por quilo de peixe, retenção de nutrientes na biomassa e desempenho zootécnico com alta taxa de sobrevivência. Os pesquisadores também apontaram um ponto de atenção que pesa no bolso do produtor: a demanda de energia para aeração e mistura, que exige planejamento técnico e financeiro para viabilizar lotes maiores.

O que é o sistema de bioflocos (BFT)

O BFT é um método de cultivo em que microrganismos formam agregados flutuantes, os chamados flocos, capazes de reciclar parte dos resíduos gerados no próprio tanque. Com isso, sólidos em suspensão, restos de ração e compostos nitrogenados passam a integrar um circuito de reaproveitamento interno. O peixe consome parte desses flocos como alimento complementar, o que contribui para o ganho de peso e para o aproveitamento dos insumos.

Para que os flocos se mantenham estáveis, o ambiente precisa de aeração constante e de uma estratégia de fornecimento de carbono para ajustar a relação entre carbono e nitrogênio. No estudo em Foz do Iguaçu, a equipe manteve a proporção carbono:nitrogênio em 12:1 com adição controlada de açúcar. Esse ajuste induz o crescimento de bactérias heterotróficas e reduz a vantagem competitiva de algas, refletida na queda gradual dos níveis de clorofila-a ao longo do ciclo. O resultado é um cultivo com pouca renovação de água e maior controle dos parâmetros do tanque.

Resultados do experimento em Foz do Iguaçu

Em 70 dias de cultivo, tanques circulares de 4,2 m³, operando com densidade próxima de 395 peixes por metro cúbico, produziram quase 5 mil alevinos por unidade. A taxa de sobrevivência atingiu 98% e o peso médio ao final foi de 20,4 gramas. A conversão alimentar aparente ficou em 1,05, o que, na prática, significa 1,05 kg de ração para cada 1 kg de ganho em peso. Esses indicadores alinham desempenho zootécnico com eficiência de uso da ração e ajudam a equilibrar custos operacionais.

A equipe aplicou balanço de massa para estimar entradas e saídas de nutrientes. O BFT reteve 45,4% do nitrogênio, 46,3% do fósforo e 29,7% do carbono ofertados principalmente pela ração. Ao término do ciclo, a carga residual por tonelada de peixe foi estimada em 10,24 kg de fósforo, 46,63 kg de nitrogênio e 442,47 kg de carbono. Em comparação com sistemas abertos, os valores são menores, o que indica melhor aproveitamento dos nutrientes dentro do próprio cultivo. O uso de água também chama a atenção: 135 litros por quilo de tilápia produzida, patamar compatível com a operação de baixa renovação que caracteriza o BFT.

Por que o BFT usa pouca água e mantém nutrientes no sistema

O baixo consumo hídrico decorre de duas bases operacionais. A primeira é a recirculação interna: a água permanece no tanque por longos períodos, sofrendo apenas reposições pontuais para compensar perdas por evaporação, manejo de sólidos e colheita. A segunda é a transformação de resíduos em biomassa microbiana, o que reduz a necessidade de descargas frequentes. Menos trocas significam menos reposição de água, com impacto direto no custo e na logística de captação e distribuição dentro da propriedade.

A retenção de nitrogênio e fósforo ocorre porque grande parte desses elementos, originalmente presente na ração, é incorporada pelos microrganismos e, na sequência, pelos próprios peixes quando consomem os flocos. Assim, o que seria descartado como resíduo se converte em alimento dentro do ciclo produtivo. Essa dinâmica ajuda a manter a qualidade da água estável e favorece a eficiência alimentar em densidades elevadas, desde que a aeração e o controle de sólidos sejam conduzidos com rigor.

Como implantar: passo a passo do arranque ao primeiro lote

A implantação começa pela definição do volume útil e do número de tanques, considerando disponibilidade elétrica, espaço e mão de obra. Tanques circulares facilitam a suspensão homogênea dos flocos e simplificam a coleta de sólidos no fundo. O dimensionamento da aeração deve prever funcionamento contínuo, inclusive com plano de contingência para quedas de energia. Bombas e sopros de ar devem atender à biomassa prevista para o pico do ciclo, não apenas ao início do povoamento.

Com a estrutura pronta, o arranque do BFT segue uma sequência: enchimento com água de boa qualidade, inoculação microbiana (via flocos maduros de outro tanque saudável ou formação natural a partir de nutrientes e fonte de carbono), estabilização da relação C:N e monitoramento diário de temperatura, oxigênio dissolvido, pH e sólidos suspensos. Somente após a formação consistente dos flocos o produtor deve avançar para a estocagem de alevinos, começando com biomassa moderada e programando aumentos progressivos conforme o sistema demonstra estabilidade.

  • Planejamento do ciclo: defina metas de peso e tempo de cultivo para calibrar oferta de ração, densidade e potência de aeração.
  • Inoculação: se possível, use 10% a 20% de água de um tanque BFT saudável para acelerar a formação dos flocos; em alternativa, conduza a formação com fonte de carbono e manejo de sólidos.
  • Relação C:N: mantenha a meta de 12:1 no início e ajuste conforme análise de amônia e nitrito ao longo do ciclo.
  • Aeração e mistura: distribua difusores de forma a evitar zonas mortas; verifique diariamente ruído, vibração e temperatura dos sopradores.
  • Povoamento: use alevinos uniformes e aclimatados; registre peso inicial e quantidade para alimentar o balanço de massa.

Manejo diário: monitoramento, alimentação e controle de sólidos

O sucesso do BFT passa pela rotina. Medir oxigênio dissolvido nos horários mais críticos, acompanhar pH e alcalinidade, e observar a coloração e a textura dos flocos são tarefas que evitam surpresas. O ideal é trabalhar com um roteiro fixo de checagens, compatível com o turno da equipe. Se o tanque apresenta espuma persistente ou odor atípico, é sinal de que o manejo precisa de correção, seja na oferta de ração, seja na dosagem de carbono.

A alimentação deve ser fracionada ao longo do dia para reduzir picos de amônia. Dosadores automáticos ajudam na regularidade, mas o acompanhamento visual do consumo é indispensável. A presença dos flocos permite reduzir a proteína da dieta em determinados momentos do ciclo, sem comprometer o crescimento, pois parte do aporte proteico vem do próprio biofilme microbiano. Já o controle de sólidos é feito por sifonagem, descarte parcial para remoção de lodo e uso de cones de Imhoff para medir o volume de sólidos sedimentáveis e ajustar a rotina de limpeza.

  • Parâmetros básicos: temperatura, oxigênio dissolvido, pH, alcalinidade, amônia, nitrito e sólidos suspensos totais.
  • Sinais de alerta: peixe em superfície ofegante, queda abrupta no apetite, flocos demasiadamente escuros ou quebradiços, espuma espessa e persistente.
  • Ajustes rápidos: reduzir oferta de ração temporariamente, reforçar aeração, dosar fonte de carbono em pequenas parcelas e intensificar remoção de sólidos.

Energia e aeração: como dimensionar e cortar gastos

A aeração contínua é o item que mais pesa na conta de energia do BFT. Por isso, o dimensionamento começa pelo pico de demanda de oxigênio, quando a biomassa está alta e a temperatura favorece o metabolismo. Mapear essa etapa evita subdimensionamento, que gera risco ao plantel, e sobredimensionamento, que encarece a operação. Difusores limpos e bem distribuídos entregam bolhas finas e melhor transferência de oxigênio, o que diminui o tempo de operação necessário para manter o nível alvo de oxigênio dissolvido.

Três frentes ajudam a reduzir gasto elétrico sem comprometer o desempenho. A primeira é a manutenção preventiva dos sopradores e motores, com troca de filtros e verificação de folgas e aquecimento. A segunda é a automação simples, que liga e desliga estágios de aeração com base em leituras confiáveis de oxigênio. A terceira é o desenho hidráulico do tanque: circulação bem planejada evita bolsões de baixa oxigenação e reduz a perda de carga em tubulações. Em regiões com tarifa elevada, vale comparar a operação em horários fora de ponta, sempre garantindo continuidade do fornecimento para não estressar os peixes.

Balanço de massa na prática: contas simples para não perder nutrientes

O balanço de massa traduz em números aquilo que o produtor vê no dia a dia. As entradas principais são ração, água de reposição e biomassa inicial. As saídas são o peixe colhido, as purgas líquidas e os sólidos removidos por sifonagem. Quando esses itens são medidos com disciplina, fica claro quanto dos nutrientes foi convertido em peixe e quanto foi para as purgas. No ensaio mencionado, o BFT reteve 45,4% do nitrogênio e 46,3% do fósforo ofertados. Esses percentuais ajudam a projetar compras e a planejar a frequência de manejo dos sólidos ao longo do ciclo.

Para aplicar no campo, registre diariamente a ração fornecida e a biomassa estimada a partir de amostragens de peso. Some as purgas e o volume de lodo retirado. No fim do ciclo, compare com o peso total colhido. Se a fração de nutrientes perdida estiver acima do esperado, investigue oferta de ração, regularidade da aeração e estabilidade da relação C:N. Ajustes pontuais em qualquer um desses pontos podem recuperar grande parte do insumo que estava escapando do processo produtivo.

Resíduos do BFT viram insumos: o que fazer com lodo e espuma

O lodo retirado do fundo concentra matéria orgânica e nutrientes. Em vez de descartar, o produtor pode secar, estabilizar e direcionar esse material para uso agrícola como insumo. Outra rota é aproveitar o lodo como ingrediente em dietas para organismos filtradores ou como aditivo em processos de compostagem, desde que se atenda a critérios sanitários e de qualidade. Em ambos os casos, é essencial separar a fase sólida da líquida de forma eficiente, usando decantadores simples ou leitos de secagem.

A espuma acumulada em períodos de maior oferta de ração pode carregar proteínas e surfactantes naturais. Coletas pontuais com skimmer reduzem a carga orgânica no tanque e melhoram a clareza da água. Esse material também pode seguir para unidades de secagem, integrando o mesmo fluxo do lodo. Ao transformar resíduos em insumos úteis, a propriedade reduz compras de fora e melhora o balanço global de nutrientes do sistema.

Densidade, bem-estar dos peixes e qualidade da água

O BFT aceita densidades elevadas quando o manejo é rigoroso. No ensaio realizado, foram cerca de 395 peixes por metro cúbico, com 98% de sobrevivência. Esse resultado exige três pilares: oxigênio estável, sólidos sob controle e alimentação regular. Mesmo com desempenho positivo, vale lembrar que a biomassa em alta densidade responde rápido a falhas de energia ou a interrupções na aeração. Planos de contingência com gerador e cilindros de oxigênio reduzem riscos em eventos críticos.

O comportamento dos peixes fornece pistas diárias. Alimentação vigorosa, nado ativo e ausência de aglomerações na superfície indicam conforto. Já boquejamento, nado errático ou recusa de ração pedem resposta imediata. O uso de telas ou coberturas sobre tanques diminui o estresse por luz intensa, reduz perdas por fuga e auxilia no controle de aves. A rotina de biometria quinzenal ajuda a ajustar o tamanho do pellet e a curva de alimentação conforme o lote evolui.

Ração e estratégia alimentar para aproveitar os flocos

O consumo dos flocos pelos peixes permite estratégias de ração mais precisas. Uma abordagem comum é iniciar o ciclo com dietas de maior proteína e reduzir gradualmente o teor proteico conforme a comunidade microbiana se estabelece, sempre com base em desempenho e saúde do lote. Essa transição evita excesso de nitrogênio no sistema e contribui para conversões alimentares mais baixas, como a marca de 1,05 observada no estudo de referência.

Dividir as refeições em várias porções diárias reduz picos de amônia e melhora o aproveitamento. Dosadores programáveis somados à verificação de bandejas de alimentação mantêm a regularidade do fornecimento sem abrir mão do olhar do tratador. Em períodos de frio, ajuste a curva para evitar sobras, preservando a qualidade da água. Sempre que possível, mantenha registros diários que relacionem oferta de ração, ganho de peso e condição dos flocos. Essa série histórica apoia decisões e encurta o tempo de reação a qualquer desvio.

Controle de amônia, nitrito e alcalinidade: o trio que pede atenção

Amônia e nitrito são os compostos que mais preocupam em cultivos intensivos. No BFT, a estratégia com fonte de carbono direciona parte do nitrogênio para a biomassa microbiana, reduzindo a fração tóxica. Ainda assim, medições regulares são obrigatórias, sobretudo nas primeiras semanas, quando o sistema está em ajuste. Se a amônia subir, três medidas costumam trazer o tanque de volta ao trilho: diminuir temporariamente a ração, reforçar a aeração e dosar carbono em pequenas parcelas para restabelecer a relação C:N.

A alcalinidade funciona como tampão do pH e dá previsibilidade às reações químicas da água. Nitrificação e processos microbianos consomem alcalinidade; por isso, a reposição com fontes alcalinas apropriadas deve fazer parte da rotina. O produtor experiente não espera o pH cair para agir: calibra a dosagem de maneira preventiva, com base nas leituras da semana e na tendência de consumo do lote.

Custos, estrutura e retorno: como organizar a planilha

O orçamento deve separar investimento inicial e despesas de operação. No primeiro grupo entram tanques, sopradores, difusores, tubulações, sensores e gerador. No segundo, ração, energia, mão de obra, reposição de água, manutenção e insumos de laboratório. O BFT se beneficia de consumo hídrico baixo e conversão alimentar reduzida, mas pede atenção na conta de energia. Assim, cada produtor precisa calcular o ponto de equilíbrio do próprio sistema, considerando o preço de venda do peixe e a sazonalidade da região.

Uma forma prática de avaliar o retorno é projetar um ciclo padrão, por exemplo, 70 a 90 dias, e testar cenários de conversão (1,05 a 1,30), mortalidade (2% a 8%) e custo da ração. A partir daí, simule a fatura de energia considerando diferentes estratégias de aeração e verifique a sensibilidade do resultado. Essa análise mostra se vale investir em automação, se o gerador precisa ser mais robusto e como a compra de ração em maior volume impacta o caixa. O objetivo é chegar a uma operação previsível, com margem segura e capacidade de responder a imprevistos sem comprometer o lote.

Caso prático: o que os números do estudo ensinam ao pequeno e ao médio produtor

Os resultados de Foz do Iguaçu ajudam a orientar decisões em propriedades de diferentes portes. Para o pequeno produtor, o destaque é a economia de água. Trabalhar com 135 litros por quilo de peixe reduz a dependência de novas captações e facilita operar em áreas periurbanas. A taxa de sobrevivência de 98% mostra que, com rotina bem conduzida, é possível atingir densidades altas sem penalizar o lote. A conversão de 1,05 reforça a importância de calibrar a dieta ao longo do ciclo, aproveitando o aporte nutricional dos flocos.

Para o médio produtor, o balanço de massa traz uma agenda de melhorias contínuas. Reter 45,4% do nitrogênio e 46,3% do fósforo dentro do sistema significa comprar insumos de forma mais estratégica e planejar o reaproveitamento de sólidos de maneira a reduzir perdas. Ao mesmo tempo, a energia segue como ponto de atenção: vale cotar equipamentos eficientes, manter filtros limpos e estudar a automação do acionamento para evitar horas desnecessárias de operação em momentos de baixa demanda de oxigênio.

Biosegurança e protocolos de rotina

Em sistemas intensivos, o controle de entrada de patógenos é decisivo. Alevinos devem vir de fornecedores confiáveis e chegar com documentação sanitária. A aclimatação lenta, o uso de redes específicas para cada tanque e a desinfecção de utensílios entre manejos reduzem riscos. Em caso de mortalidade acima do padrão, o procedimento é isolar a unidade, coletar amostras e acionar assistência técnica. Anotações diárias de evento, horário e ação tomada facilitam o diagnóstico e encurtam o tempo de resposta.

O BFT, por operar com baixa renovação, permite controle maior sobre o que entra e sai do sistema. Barreiras físicas, como telas e antecâmaras, somam-se a medidas simples, como pedilúvios e organização do fluxo de pessoas. Na colheita, é indicado planejar primeiro os tanques com melhor desempenho e avaliar sinais visuais dos flocos antes de decidir por purgas adicionais. Esses cuidados preservam o histórico do lote e contribuem para manter a previsibilidade da operação.

Instrumentos e rotinas de medição que fazem diferença

Oxímetro confiável e com calibração em dia é equipamento indispensável. Medidores de pH e temperatura com compensação automática oferecem leituras mais estáveis. Cones de Imhoff apoiam a decisão sobre remoção de sólidos, enquanto kits colorimétricos para amônia e nitrito dão o alerta precoce de possíveis desvios. Em propriedades com vários tanques, planilhas digitais ou aplicativos de manejo ajudam a centralizar dados, gerar gráficos e apontar tendências semanais.

A rotina de medição deve caber no tempo real da equipe. Comece pelos parâmetros críticos, como oxigênio, e adicione os demais conforme a operação amadurece. Treinamentos rápidos, com foco em coleta, armazenamento e interpretação, reduzem erro humano. Em casos de divergência entre instrumentos, refaça a medição e valide com padrão conhecido. O objetivo é que os números reflitam o que está acontecendo no tanque para embasar decisões sem delay.

Ajuste da relação C:N: como dosar a fonte de carbono sem exagero

A dosagem de carbono começa com a conta simples: para cada unidade de nitrogênio que entra pela ração, é preciso adicionar carbono suficiente para manter a meta da relação C:N. No estudo, a equipe trabalhou com 12:1 usando açúcar como fonte. A aplicação em pequenas parcelas ao longo do dia reduz picos e evita oscilações bruscas no pH. A observação direta ajuda a corrigir a mão: flocos muito claros podem indicar falta de carbono; flocos muito escuros e pegajosos pedem revisão na dosagem e no controle de sólidos.

A escolha da fonte de carbono leva em conta preço, disponibilidade e efeito no sabor da água. Açúcar, melaço e outras opções apresentam respostas distintas no tanque. Qualquer que seja a escolha, o monitoramento de amônia e nitrito dá o veredito. Se a curva cair após o ajuste, a dosagem está cumprindo seu papel. Se não houver resposta, avalie aeração, oferta de ração e a maturidade dos flocos antes de aumentar a dose.

Quando e como renovar água no BFT

Mesmo operando com baixa renovação, alguns momentos pedem reposição. Purgas planejadas para remoção de lodo e controle de sólidos exigem recompletar o nível para manter o volume útil. Em episódios de desequilíbrio, como aumento da amônia não ionizada, trocas parciais ajudam a reduzir a concentração e ganhar tempo para ajustes finos no manejo. O ponto-chave é não depender de grandes trocas para corrigir rotinas falhas: a prevenção sempre custa menos do que intervenções de emergência.

Planeje a reposição com água de boa qualidade, temperatura próxima à do tanque e livre de contaminantes. Filtração simples e desinfecção adequada antes da entrada no sistema evitam introdução de organismos indesejados. Em propriedades com captação própria, programar a reposição fora dos horários de pico da rede elétrica pode reduzir o custo por metro cúbico bombeado.

Perguntas que o produtor costuma fazer

O BFT funciona em regiões quentes e frias? Funciona em ambas, com ajustes. Em regiões frias, o metabolismo do peixe cai; o manejo da ração precisa acompanhar. Em áreas quentes, a demanda de oxigênio sobe e a aeração deve ser reforçada. O essencial é manter os parâmetros estáveis e evitar mudanças bruscas.

Preciso de laboratório complexo? Não. Kits simples e instrumentos portáteis dão conta do manejo diário. Em momentos de dúvida, enviar amostras para um laboratório parceiro ajuda a confirmar leituras e orientar correções. O foco é disciplina na coleta e consistência nos registros.

E se faltar energia? Tenha plano B. Gerador dimensionado, manutenção em dia e rotina de testes minimizam riscos. Cilindros de oxigênio para suporte emergencial acrescentam uma camada de segurança durante paradas de curto prazo.

Posso reaproveitar o lodo? Sim, desde que tratado e destinado de forma adequada. Secagem e estabilização transformam o material em insumo para uso agrícola ou em processos de compostagem. Avalie critérios sanitários e as regras locais antes de avançar.

Checklist de implantação

Antes do primeiro povoamento, confirme que cada item essencial está pronto e testado. A pressa costuma custar caro em ambientes de alta densidade. Um checklist simples evita esquecimentos e padroniza a rotina da equipe, do enchimento à arranque dos flocos, passando pela calibração dos instrumentos e pelo plano de contingência elétrica.

Na fase de maturação do sistema, priorize leituras frequentes e ajustes pequenos. O objetivo é alcançar estabilidade com segurança, sem depender de intervenções drásticas. Após o primeiro ciclo completo, faça uma revisão geral: o que funcionou, o que precisa mudar e onde a propriedade pode ganhar eficiência no próximo lote.

  • Estrutura: tanques íntegros, difusores limpos, tubulações sem vazamentos e proteção contra entrada de folhas e detritos.
  • Aeração: sopradores revisados, correias tensionadas, filtros novos e plano de backup testado.
  • Instrumentação: oxímetro calibrado, pHmetro operante, kits de amônia e nitrito dentro do prazo.
  • Insumos: ração conforme fase do lote, fonte de carbono disponível e alcalinizante em estoque.
  • Procedimentos: rotina de medição definida por horário, planilha de registros e responsáveis por turno.
  • Segurança: gerador com combustível, EPIs para a equipe e protocolo para eventuais mortalidades.

O papel da formação dos flocos na eficiência do sistema

Flocos estáveis são o coração do BFT. Eles oferecem superfície para microrganismos úteis, retêm partículas finas e servem de alimento complementar. Um erro comum é acelerar a introdução de peixes antes de os flocos amadurecerem. O resultado costuma ser oscilação de amônia e nitrito, exigindo correções mais frequentes. Ao contrário, quando a maturidade microbiana chega, o tanque “segura” melhor os picos de carga após a alimentação, e o lote responde com crescimento uniforme.

A textura dos flocos conta a história do manejo. Se estão muito leves e dispersos, podem não reter partículas suficientes; se estão muito densos e agregados, sugerem excesso de matéria orgânica. O ponto de equilíbrio aparece com experiência e registro. Fotos periódicas e notas sobre cor, odor e sedimentação ajudam a equipe a criar um repertório próprio para reconhecer a boa condição do sistema.

Colheita, classificação e preparo do próximo ciclo

A colheita deve ser planejada a partir dos objetivos comerciais. Se o mercado exige tamanhos específicos, a classificação antecipada separa lotes por peso e otimiza o uso da ração. Em tanques BFT, a captura cuidadosa evita levantar lodo e suspender sólidos, o que poderia afetar os peixes remanescentes. Após o esvaziamento parcial, avalie a necessidade de purga adicional para remover sedimentos antes de repovoar.

Entre ciclos, a decisão de manter parte da água para inocular os próximos flocos ou de renovar uma fração maior depende do histórico do tanque. Se os indicadores foram estáveis e o lote fechou bem, manter água amadurecida acelera a retomada. Caso contrário, purgas mais amplas e limpeza reforçada restabelecem a base para um novo arranque. Em ambos os casos, retome a meta da relação C:N desde o início para evitar picos na fase inicial do próximo ciclo.

Pontos-chave do estudo e lições para a produção comercial

Os dados obtidos em Foz do Iguaçu trazem quatro mensagens centrais para quem planeja adotar o BFT: consumo de água baixo (135 L/kg), retenção relevante de nutrientes (45,4% de nitrogênio e 46,3% de fósforo), alta taxa de sobrevivência (98%) e conversão alimentar de 1,05. Em conjunto, esses números indicam que é possível trabalhar com densidades altas e previsibilidade de desempenho, desde que o manejo seja disciplinado e a aeração esteja à altura da biomassa em cada fase do ciclo.

A outra lição é o peso da energia na viabilidade econômica. O produtor que investe em manutenção preventiva, automação simples e desenho hidráulico bem resolvido consegue reduzir horas de operação desnecessárias. Ao mesmo tempo, aproveitar os flocos como complemento alimentar e direcionar corretamente o lodo para uso produtivo melhora o balanço de insumos. São decisões cotidianas que, somadas, fazem a operação fechar a conta e ganhar escala com segurança.



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